quinta-feira, 21 de novembro de 2013

A Grande Sabedoria

A grande sabedoria vê tudo num só. A pequena sabedoria multiplica-se entre as muitas partes.

Quando o corpo adormece, a alma envolve-se no UNO. Quando o corpo desperta, os sentidos abertos começam a funcionar. Ressoam a cada encontro com os afazeres vários da vida, as dificuldades do coração.

Os homens estão bloqueados, perplexos, perdidos na dúvida. Pequenos temores devoram a paz do seu coração. Grandes temores os tragam totalmente. Flechas vão de encontro ao alvo: acertam e erram, certo e errado. A isto é que os homens chamam discernimento, decisão.

Seus pronunciamentos são tão definitivos, como os tratados entre imperadores. Ah, eles alcançam o que desejam! Mas, mesmo assim, seus argumentos esmorecem mais rápido e mais fracos que folhas mortas no outono e no inverno.

Suas conversas fluem como urina, para nunca mais se recomporem. Ficam, por fim, bloqueados, limitados e amordaçados. Obstruídos como velhos canos. A mente falha, nunca mais verá a luz.

O prazer e a raiva, a tristeza e a alegria, esperança e perdão, mudança e estabilidade, fraqueza e firmeza, impaciência e preguiça: todos são sons da mesma flauta. Todos são cogumelos do mesmo úmido mofo.

Dia e noite seguem-se um ao outro e vêm até nós, sem vermos como eles brotam.

Basta! Basta!

Cedo ou tarde encontramos o “quê”, do qual todos “estes” crescem! Se não houvesse o “quê”, não haveria o “isto”! Se não houvesse o “isto”, nada haveria com que estas cordas tocassem.


Até aí podemos chegar. Mas, como compreender a causa de tudo isso?Pode-se supor o verdadeiro governante por detrás de tudo. Que tal força opera, eu acredito. Não posso ver sua forma. Ela age, mas, é sem forma.

Chuang Tzu

Extraído de: A Via de Chuang Tzu. Thomas Merton. Editora Vozes

terça-feira, 12 de novembro de 2013

Conhece-te!

Nosso corpo está em nós, mas, por mais que tal pareça real, nós não estamos no corpo. O corpo aparece como ideia, como algo percebido. Quando acordamos de manhã, é o corpo que desperta em nós, não o contrário! 

Jean Klein






Tradução livre do blog

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

A Natureza da Realidade!



Na sua essência, antes de terem sido contaminadas pela imensamente egoísta capacidade que o ser humano tem para distorcer as coisas segundo seus próprios interesses, todas as religiões, de todos os tempos e de todas as localidades, apontam primária e objetivamente para o fato de que nós, talvez, estejamos percebendo a realidade de maneira equivocada.

O Zen, há quase dois mil anos, afirma que nós estamos "perdendo o óbvio". Jesus, de sua parte, afirma com veemência: conheçam a verdade e a verdade os libertará. No advaita Vedanta, diz-se que toda a realidade manifesta, da forma como nós a temos percebido, é "Mahamaya", que pode ser traduzida como a Grande Ilusão. Antes de Sócrates, na Grécia, Parmênides postulava que: "a linguagem é o rótulo das coisas ilusórias". E, por fim, na raiz da sua etimologia, a palavra "pecado" não tem absolutamente o significado que lhe tem sido dado. De origem grega, ela quer muito mais se referir a algo semelhante a um erro de percepção, a uma espécie de equívoco, do que propriamente ao cometimento de uma falta ou à violação de alguma regra.

Teria o ser humano, em algum momento, perdido a capacidade de perceber o óbvio? Seria isto possível?Estariam todas estas sabedorias apontando para o fato de que, de certa forma, o ser humano deixou de perceber alguma coisa? Teria esta afirmação alguma relação com a alegoria bíblica do homem "caindo" do paraíso?

Na verdade, sim! É para isto que todas estas sabedorias apontam: para o fato de que, há milênios, o ser humano se enredou numa teia de conceitos, significados e ideias que, de certa forma, fizeram com que ele passasse a experimentar uma realidade mental e conceitualmente construída, superposta, por assim dizer, à realidade verdadeira.

E a causa desta perdição foi que, maravilhado com o mundo, com os objetos e entidades que a imaginação era capaz de criar, o Ser, que é a essência de todos nós, voltou a sua atenção "para fora", perdendo-se de si mesmo.

E a sedução exercida por este "lá fora", por esta ideia ilusória de um mundo, é tal e tamanha que, embora ela nos venha expondo a um constante e recorrente sofrimento existencial, dela nós não conseguimos nos desvencilhar, o que poderia ocorrer apenas se tivéssemos a coragem de nos debruçar sobre todos os inúmeros dogmas e todas as incontáveis crenças - aparentemente tão inquestionáveis - que têm criado, apenas no nível da mente e da imaginação, uma realidade inteiramente conceitual. 

Mas, o homem não se arrisca a tanto. Afinal, o olhar para este emaranhado de crenças, no qual nós fomos ensinados a acreditar tão inquestionavelmente, é algo que requer imensa coragem e enorme disposição, já que tomar esta atitude significa romper com o senso comum, o que nos expõe à desconfortável possibilidade de que, por assim dizer, toda a nossa crença de mundo e de realidade desmorone. 

Ainda que se aponte para o fato de que a sua imaginação possa o estar enredando num equívoco, você não quer abrir mão da (falsa) sensação de segurança que o "conhecido" lhe garante e proporciona.

Veja, por exemplo! Você se diverte imensamente e até sente certa compaixão quando observa as crianças esperando pelo Papai Noel. Mas, do ponto de vista puramente experimental, qual a diferença entre a crença que as crianças têm no Papai Noel e a crença que você tem tido em todos os santos, demônios, divindades, espíritos, orixás e coisas do gênero? Todos eles habitam apenas as projeções criadas pela sua imaginação.

Agora, para além disto, observe quanto da sua percepção da realidade também tem se baseado exclusivamente na sua imaginação, nas suas crenças! Qual seria a sua percepção da realidade se você não tivesse a capacidade de imaginar?

Tenha coragem de questionar todas aquelas verdades que lhe vêm sendo impostas como absolutas.