quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

A Raiz do Medo

Visitante: Por que nós temos tanto medo em nossas vidas? Por que confiar em cada momento é tão difícil?

Papaji: Se você vive no ego, você automaticamente monta situações de "eu e o resto do mundo". Para defender o ego, você deverá ser egoísta e você deverá temer os outros porque eles todos ameaçam o seu bem estar. Como você pode confiar em qualquer um nessa situação?


Papaji

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Identidade e Consciência



Uma das mais belas descrições do indescritível.
Do amigo Pedro Fonseca.

"Os outros têm de ti apenas uma representação. Aos outros tu apareces como objeto. Mas tu, a ti mesmo, vives-te como sujeito. Aquilo que tu és verdadeiramente é a vivência subjetiva que tens de ti mesmo como sujeito de percepções e experiências. Tu és Aquele que vê e não aquilo que é visto. A tua dimensão como sujeito jamais poderá surgir no campo de percepção do outro. O outro apenas pode vivenciar a sua própria subjetividade que a ti é invisível. Somos todos invisíveis uns para os outros! É só ao nível da subjetividade interna que a realidade ultima é experienciada.

Em ultima instância apenas a consciência é real, pois a consciência é a condição de toda a experiência. 


A pessoa separada não existe. A sensação de sermos indivíduos separados é ilusória. Origina-se da identificação com o corpo e a história. Tu não és diferente de mim. Somos apenas diferentes ondas de um mesmo oceano de existência. Todas as distinções aparentes são emanações de um único campo universal de inteligência. Não existe outra realidade além da consciência única da qual todos participamos. Dessa linha invisível, subjacente a todos esses centros de percepção que emergem como os nossos corpos aparentes. Não existe nada a distinguir e a separar duas gotas de água que se elevam do oceano. E todo o oceano se manifesta em cada gota!"

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

A Grande Sabedoria

A grande sabedoria vê tudo num só. A pequena sabedoria multiplica-se entre as muitas partes.

Quando o corpo adormece, a alma envolve-se no UNO. Quando o corpo desperta, os sentidos abertos começam a funcionar. Ressoam a cada encontro com os afazeres vários da vida, as dificuldades do coração.

Os homens estão bloqueados, perplexos, perdidos na dúvida. Pequenos temores devoram a paz do seu coração. Grandes temores os tragam totalmente. Flechas vão de encontro ao alvo: acertam e erram, certo e errado. A isto é que os homens chamam discernimento, decisão.

Seus pronunciamentos são tão definitivos, como os tratados entre imperadores. Ah, eles alcançam o que desejam! Mas, mesmo assim, seus argumentos esmorecem mais rápido e mais fracos que folhas mortas no outono e no inverno.

Suas conversas fluem como urina, para nunca mais se recomporem. Ficam, por fim, bloqueados, limitados e amordaçados. Obstruídos como velhos canos. A mente falha, nunca mais verá a luz.

O prazer e a raiva, a tristeza e a alegria, esperança e perdão, mudança e estabilidade, fraqueza e firmeza, impaciência e preguiça: todos são sons da mesma flauta. Todos são cogumelos do mesmo úmido mofo.

Dia e noite seguem-se um ao outro e vêm até nós, sem vermos como eles brotam.

Basta! Basta!

Cedo ou tarde encontramos o “quê”, do qual todos “estes” crescem! Se não houvesse o “quê”, não haveria o “isto”! Se não houvesse o “isto”, nada haveria com que estas cordas tocassem.


Até aí podemos chegar. Mas, como compreender a causa de tudo isso?Pode-se supor o verdadeiro governante por detrás de tudo. Que tal força opera, eu acredito. Não posso ver sua forma. Ela age, mas, é sem forma.

Chuang Tzu

Extraído de: A Via de Chuang Tzu. Thomas Merton. Editora Vozes

terça-feira, 12 de novembro de 2013

Conhece-te!

Nosso corpo está em nós, mas, por mais que tal pareça real, nós não estamos no corpo. O corpo aparece como ideia, como algo percebido. Quando acordamos de manhã, é o corpo que desperta em nós, não o contrário! 

Jean Klein






Tradução livre do blog

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

A Natureza da Realidade!



Na sua essência, antes de terem sido contaminadas pela imensamente egoísta capacidade que o ser humano tem para distorcer as coisas segundo seus próprios interesses, todas as religiões, de todos os tempos e de todas as localidades, apontam primária e objetivamente para o fato de que nós, talvez, estejamos percebendo a realidade de maneira equivocada.

O Zen, há quase dois mil anos, afirma que nós estamos "perdendo o óbvio". Jesus, de sua parte, afirma com veemência: conheçam a verdade e a verdade os libertará. No advaita Vedanta, diz-se que toda a realidade manifesta, da forma como nós a temos percebido, é "Mahamaya", que pode ser traduzida como a Grande Ilusão. Antes de Sócrates, na Grécia, Parmênides postulava que: "a linguagem é o rótulo das coisas ilusórias". E, por fim, na raiz da sua etimologia, a palavra "pecado" não tem absolutamente o significado que lhe tem sido dado. De origem grega, ela quer muito mais se referir a algo semelhante a um erro de percepção, a uma espécie de equívoco, do que propriamente ao cometimento de uma falta ou à violação de alguma regra.

Teria o ser humano, em algum momento, perdido a capacidade de perceber o óbvio? Seria isto possível?Estariam todas estas sabedorias apontando para o fato de que, de certa forma, o ser humano deixou de perceber alguma coisa? Teria esta afirmação alguma relação com a alegoria bíblica do homem "caindo" do paraíso?

Na verdade, sim! É para isto que todas estas sabedorias apontam: para o fato de que, há milênios, o ser humano se enredou numa teia de conceitos, significados e ideias que, de certa forma, fizeram com que ele passasse a experimentar uma realidade mental e conceitualmente construída, superposta, por assim dizer, à realidade verdadeira.

E a causa desta perdição foi que, maravilhado com o mundo, com os objetos e entidades que a imaginação era capaz de criar, o Ser, que é a essência de todos nós, voltou a sua atenção "para fora", perdendo-se de si mesmo.

E a sedução exercida por este "lá fora", por esta ideia ilusória de um mundo, é tal e tamanha que, embora ela nos venha expondo a um constante e recorrente sofrimento existencial, dela nós não conseguimos nos desvencilhar, o que poderia ocorrer apenas se tivéssemos a coragem de nos debruçar sobre todos os inúmeros dogmas e todas as incontáveis crenças - aparentemente tão inquestionáveis - que têm criado, apenas no nível da mente e da imaginação, uma realidade inteiramente conceitual. 

Mas, o homem não se arrisca a tanto. Afinal, o olhar para este emaranhado de crenças, no qual nós fomos ensinados a acreditar tão inquestionavelmente, é algo que requer imensa coragem e enorme disposição, já que tomar esta atitude significa romper com o senso comum, o que nos expõe à desconfortável possibilidade de que, por assim dizer, toda a nossa crença de mundo e de realidade desmorone. 

Ainda que se aponte para o fato de que a sua imaginação possa o estar enredando num equívoco, você não quer abrir mão da (falsa) sensação de segurança que o "conhecido" lhe garante e proporciona.

Veja, por exemplo! Você se diverte imensamente e até sente certa compaixão quando observa as crianças esperando pelo Papai Noel. Mas, do ponto de vista puramente experimental, qual a diferença entre a crença que as crianças têm no Papai Noel e a crença que você tem tido em todos os santos, demônios, divindades, espíritos, orixás e coisas do gênero? Todos eles habitam apenas as projeções criadas pela sua imaginação.

Agora, para além disto, observe quanto da sua percepção da realidade também tem se baseado exclusivamente na sua imaginação, nas suas crenças! Qual seria a sua percepção da realidade se você não tivesse a capacidade de imaginar?

Tenha coragem de questionar todas aquelas verdades que lhe vêm sendo impostas como absolutas.

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Quem Você Realmente É?

Qualquer pensamento que você tenha sobre si mesmo, seja grande ou pequeno, não é o que você é! É simplesmente um pensamento! A verdade de quem você é não pode ser pensada, porque ela é a fonte de todos os pensamentos.

O que você é, realmente, não pode ser nominado ou definido. Palavras como alma, luz, deus, verdade, ego, consciência, inteligência universal ou divindade são ao mesmo tempo capazes de evocar o êxtase da verdade, mas, totalmente inadequadas como descrição da imensidão do que você realmente é!

Independente de como você se identifica: criança, adolescente, mãe, pai, uma pessoa mais velha, uma pessoa saudável, uma pessoa doente, uma pessoa que sofre ou uma pessoa iluminada, sempre, por trás disso tudo, está a verdade sobre você. Ela não é estranha a você! Está tão próxima que você não consegue acreditar. A verdade de quem você, é intocada por qualquer conceito de quem você é! A verdade de quem você é, é livre de tudo isso! Você já é livre. E tudo o que bloqueia a compreensão e a realização desta liberdade é seu apego a alguma ideia sobre quem você é. Mas, este pensamento não impede que você seja a verdade que você é, pois você já é isto. Ele apenas o afasta da compreensão sobre quem você é.

Eu o convido a deixar que a sua atenção mergulhe naquilo que sempre esteve presente, esperando abertamente por sua própria auto realização. Quem é você, realmente?

Você é alguma imagem que aparece em sua mente? Você é alguma sensação que aparece em seu corpo? Você é alguma emoção que atravessa a sua mente e o seu corpo?  Você é algo que alguém disse que você é? Ou é uma revolta contra algo que alguém disse que você é? Estas são algumas das muitas vias erradas de identificação. Todas estas definições vêm e vão! Nascem e depois morrem! E a verdade de quem você é não vem, nem vai. Ela está presente antes do nascimento, durante toda a vida e depois da morte.

Descobrir a verdade de quem você é não é apenas possível: é seu direito de nascença! Qualquer ideia de que esta descoberta não seja para você, de que agora não é o momento, de que você não é digno ou de que você não está pronto, todas elas são apenas truques da mente! Está na hora de investigar este pensamento “eu” e perceber a sua real validade! Nesta investigação, ocorre uma abertura para a consciência inteligente que você é, finalmente reconhecer a si mesma!

A pergunta mais importante que você pode fazer a si mesmo é: quem sou eu? De certa forma, esta tem sido uma curiosidade implícita ao longo de toda a sua vida.Toda atividade, toda ação, seja ela individual ou coletiva, na sua raiz, é motivada por uma busca de auto definição. Tipicamente, você busca e espera por uma resposta positiva para esta pergunta, sempre fugindo e se esquivando de uma resposta negativa. E quando esta questão se torna explícita, o momento e o poder da pergunta direcionam a busca pela resposta, que é aberta, viva e cheia de insights cada vez mais profundos!

Você certamente já experimentou tanto o sucesso quanto o fracasso! Após um certo estágio, cedo ou tarde, você compreende que o que você é, independentemente da definição, não é satisfatório. E se esta questão não for verdadeiramente respondida, e não apenas convencionalmente respondida, você continuará com a fome deste saber. Porque, independente de como você tenha sido definido, nenhuma definição pode trazer uma certeza duradoura. E o momento em que se percebe que nenhuma resposta jamais satisfez esta dúvida, ele é crucial. Ele é muitas vezes definido como o amadurecimento espiritual.

Em seu poder e simplicidade, a pergunta “quem sou eu” lança a mente de volta à raiz da identificação pessoal, à suposição básica “eu sou alguém” e, ao invés de simplesmente aceitar esta suposição como uma verdade absoluta, você pode investigar mais profundamente.

Não é difícil constatar que esta suposição básica “eu sou alguém” cria uma dependência para muitos tipos de estratégias: ser “alguém” melhor, ser “alguém” mais protegido, “alguém com mais prazer, mais conforto, mais satisfação! Mas, quando este pensamento muito básico é questionado, a mente encontra o “eu”, que se assume como algo separado daquilo que ela vinha procurando. Isto é chamado de auto inquirição.

A pergunta mais básica: quem sou eu? É justamente a mais negligenciada. Passamos a maior parte de nossos dias dizendo a nós mesmos e aos outros que somos alguém importante, ou alguém totalmente sem importância, ou alguém grande, ou aluem insignificante. Sem nunca realmente questionar esta suposição mais básica. Quem é você, realmente?

Quando você volta a sua atenção para a pergunta “quem sou eu?”, talvez você se depare com aquela entidade que tem o seu rosto e o seu corpo, Mas, quem está ciente desta entidade? Você pode ser um objeto da sua própria consciência? Ou você é a consciência do objeto? A identificação equivocada de si mesmo como sendo algum objeto da percepção leva ao extremo prazer, mas, invariavelmente, à extrema dor! Mas, quando você está disposto a romper com as identificações, e descobre direta e completamente que é a própria percepção, a própria consciência, a busca por si mesmo através do pensamento termina! Não há absolutamente nenhuma entidade ali! Há apenas o indefinível e ilimitado reconhecimento se si mesmo, como inseparável de qualquer outra coisa. Você é livre! Você é completo! Você é infinito!

Gangaji

(tradução livre do blog)

domingo, 25 de agosto de 2013

O Mistério da Identidade

Perguntas-me quem sou! Como poderei dar-te uma resposta que seja honesta e verdadeira? Uma resposta que não te induza em ilusão? Que corresponda adequadamente àquilo que sou? Quando me fazes uma pergunta, esperas uma resposta. E a minha resposta será uma asserção verbal. Esperas uma definição daquilo que sou. Mas o que é uma definição? Toda a definição fragmenta e separa. Procura limitar e circunscrever. Quando defino um objecto, uma coisa, seja o que for, faço-o para o distinguir de outras coisas e objectos. Quando defino, digo não apenas o que a coisa é, mas também o que ela não é. Retiro-a de qualquer confusão com outras coisas quaisqueres. Toda a forma de eu me definir, será uma forma de me limitar. E sempre que eu me limitar, estarei a cometer um erro. Ao dizer que sou algo, estou a dizer também que não posso ser outra coisa qualquer. A definição exclui, deixa ficar de fora muito mais do que aquilo que abarca dentro. Por isso a definição é uma injustiça e uma fraude que cometes contigo mesmo. Porque é permanente a capacidade de te reinventares a ti próprio. Jamais poderás reter dentro de um aposento o sol que entra pela soleira da porta.

A pergunta: "o que sou?", não tem uma resposta verbal. Apenas o silêncio pode captar a tua essência. Apenas do silêncio te pode vir a resposta. E essa resposta é sentida com todo o teu ser e não apenas com o intelecto. O intelecto apenas se alimenta de palavras e de sombras. Aquilo que tu és inclui, ultrapassa e transcende qualquer resposta que o intelecto possa elaborar. Procurar que seja o intelecto a produzir a resposta é como querer pegar em ti mesmo ao colo ou querer introduzir a casa através da janela. Mesmo que achasses a definição perfeita e as palavras corretas, isso não passaria ainda de uma seta que aponta para algo que ela não contem e nela não podes encontrar. Não podes sentir a frescura da água mergulhando simplesmente no mapa de um rio. Não podes sentir o calor do fogo se a lareira de que te aproximas não passa de uma pintura numa tela. Podes fazer uma ilustração representando o sol, mas se a pendurares na parede ela não iluminará a sala. Aquilo que tu és deve permanecer um mistério não classificável! Um "Nada" que é um potencial infinito de possibilidades e metamorfoses sempre imprevisível!

Do amigo Pedro Fonseca

www.jardimdepicuro.blogspot.com

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Não se pode compreender o eterno com uma mente produto do tempo

Pergunta: Pode o passado dissolver-se repentinamente, ou é necessário, invariavelmente, um certo tempo?

Krishnamurti: Nós somos o resultado do passado. Nosso pensamento se baseia no dia de ontem e em muitos milhares de dias passados. Somos o resultado do tempo, e todas as nossas reações, todas as nossas atitudes no presente, representam o efeito cumulativo de muitos milhares de momentos, incidentes e experiências. Por consequência, para a maioria de nós, o passado é o presente, e isso se faz um fato inegável. Vocês — seus pensamentos, suas ações, suas reações — são o resultado do passado. Ora bem, o interrogante deseja saber se o passado pode ser apagado imediatamente, isto é, não dentro de certo tempo, porém imediatamente; ou esse passado cumulativo exige algum tempo, até que a mente esteja livre do presente? É importante que se compreenda a pergunta. Isto é, já que cada um de nós é resultado do passado, com um fundo de inumeráveis influências, a variarem e a se modificarem constantemente, é possível apagar-se esse fundo sem se passar pelo processo do tempo? Está claro isso? A pergunta está clara, sem dúvida. 

Pois bem: o que é o passado? O que entendemos por passado? Não nos referimos, naturalmente, ao passado cronológico, ao segundo que precedeu, não nos referimos a isso, que é coisa definidamente acabada. Referimos-nos, é claro, é claro, àsexperiências acumuladas, às reações, lembranças, tradições e conhecimentos acumulados, ao nosso depósito subconsciente de inumeráveis pensamentos, sentimentos, influências e reações. Com uma tal bagagem não é possível compreender a realidade, porquanto, necessariamente, a realidade não pertence ao tempo: ela é eterna. Por isso, não se pode compreender o eterno com uma mente que é produto do tempo. O interrogante deseja saber se é possível libertar-se a mente, ou se é possível que a mente, que é resultado do tempo, deixe de existir de súbito; ou se é necessário que se proceda a uma longa série de exames e análises para, desse modo, libertar-se a mente de suas acumulações. Vocês percebem a dificuldade da questão.

Ora, a mente é o nosso cabedal de ideias e experiências; a mente é resultado do tempo; a mente é o passado, a mente não é o futuro. Ela pode projetar-se no futuro; e a mente serve-se do presente como uma passagem para futuro; por conseguinte, o que quer que faça, seja qual for a sua atividade — sua atividade futura, sua atividade presente, sua atividade passada — ela está sempre presa na rede do tempo. É possível que a mente deixe de existir de todo, isto é, que o processo do pensamento termine? Ora, é bem claro que há muitas camadas a constituírem a mente; o que chamamos consciência tem muitas camadas, cada uma delas relacionada com a outra, cada uma dependente da outra e atuando reciprocamente uma sobre a outra; e o total de nossa consciência não é apenas o processo de experimentar, mas também o de dar nome, designar, e, ainda, armazenar na memória. Tal é o processo completo da consciência, não é? Ou acham tudo isso difícil demais? 

Quando falamos de consciência, não nos referimos ao processo de experimentar, de dar nome ou designação à experiência e guardá-la, dessa maneira na memória? Tudo isso, certamente, em níveis diferentes, constitui a nossa consciência. E pode a mente, que é resultado do tempo, mediante um processo de análise, chegar, passo a passo, a libertar-se da experiência acumulada? Ou é possível ficar-se inteiramente livre do tempo e contemplar-se diretamente a realidade? Vejamos. Isso lhes interessa? Esta questão, é realmente importante, pois é possível, como logo explicarei, ficarmos livres da experiência acumulada e, assim, renovarmos imediatamente a nossa vida, sem dependermos do tempo, recriar-nos de pronto, independentemente do tempo. Se isso lhes interessa, prosseguirei e verão.

Para ficarmos livres da experiência acumulada, dizem muitos analistas que devemos examinar cada reação, cada complexo, cada empecilho, cada obstáculo, o que necessariamente implica um processo de tempo; e significa, também, que o analista tem de compreender o que está analisando; e que não deve interpretar erroneamente aquilo que está analisando. Porque, se o interpretar falsamente, tal interpretação o levará a conclusões errôneas, com o que se constituirá um novo acervo mental. Percebem? Por consequência, o analista precisa ser capaz de analisar os seus pensamentos, sem o mais leve desvio; e não deve errar só um passo, na sua análise, porquanto, qualquer passo em falso, qualquer conclusão errônea, significa a formação de um novo fundo mental de desordem diferente e em nível diferente. E surge, também, o seguinte problema: Será o analista diferente da coisa analisada? Não representam o analista e a coisa analisada um fenômeno em conjunto? Senhor, não sei se isso lhe interessa, mas, em todo caso, continuarei. 

Indubitavelmente, o indivíduo que experimenta e a sua experiência constituem um fenômeno em conjunto, não são dois processos separados. Vejamos, pois, em primeiro lugar, a dificuldade de analisar. É quase impossível analisar tudo o que se contém em nossa consciência e ficar-se livre, por um tal processo. Porque, afinal de contas, quem é o analista? O analista não é diferente, embora o pense, da coisa analisada. Pode separar-se da coisa analisada, mas sempre faz parte dela. Tenho um pensamento, tenho um sentimento, sinto, por exemplo, cólera. A pessoa que analisa a cólera faz parte, ainda, da cólera; por conseguinte, o analista e a coisa analisada constituem um fenômeno conjunto, e não duas forças ou processos separados. Assim, pois, a dificuldade de nos analisarmos, de nos descerrarmos, de olharmos a nós mesmos, página por página, observando cada reação, cada resposta, é incalculável e exige muito tempo. Não concordam? Portanto, essa não é a maneira indicada para nos libertarmos do complexo de nossos sentimentos. Não é assim? Deve, portanto, haver uma maneira de proceder mais simples e direta; é o que vamos verificar. Mas, para verificarmos, precisamos abrir mão de tudo o que é falso. A análise, pois, não é o processo correto e devemos abandoná-la. Assim como não tomariam um caminho que não leva a parte alguma, assim também cumpre evitarem o processo da análise, que não lhes levará a parte alguma; ele está, por conseguinte, fora do sistema de vocês. 

Que lhes resta, então? Vocês estão habituados somente à análise, não é verdade? O observador que observa — sendo o observador e a coisa observada um fenômeno conjunto — o observador que observa e procura analisar a coisa observada, não conseguirá libertar-se do seu acervo mental. Se assim é — e de fato é — devem abandonar tal processo, não? Não sei se estão compreendendo tudo isso. Ao perceberem que tal método é falso, ao compreenderem, não apenas verbalmente, porém, realmente, que é falso esse processo, o que acontece, então, à análise de vocês? Desistem de analisar, não é verdade? E o que lhe resta então? Atente, senhor, para o que estou dizendo, segui-o, se lhe agrada, e verá com que rapidez um indivíduo pode libertar-se do seu acervo mental. Mas, se a análise não é o método correto, o que lhes resta ainda? Qual é o estado da mente habituada a analisar, pesquisar, perscrutar, dissecar, tirar conclusões, etc.? Se esse processo se detém, qual é o estado da mente de vocês? 

Vocês dizem que a mente fica vazia. Pois bem: continuem a penetrar nessa mente vazia. Por outras palavras, ao deitarem fora, como falso, o que é conhecido, o que acontece com a mente? Afinal de contas, o que foi que deitaram fora? Deitaram fora o falso processo resultante do acervo de ideias e experiências de vocês. Não é assim? De um só golpe, por assim dizer, lançaram fora tudo isso. Por conseguinte, a mente de vocês, depois de rejeitarem o processo analítico e tudo o que ele implica, e de o reconhecerem como falso, fica liberto do "ontem", sendo assim, capaz de observar diretamente, sem passar pelo processo do tempo, com o que se desfaz, imediatamente, do seu acervo de ideias e experiencias.

Senhor, formulemos diferentemente a questão: o pensamento é resultado do tempo, não é verdade? O pensamento é resultado do ambiente, de influências sociais e religiosas, e tudo isso faz parte do tempo. Pois bem: pode o pensamento ficar livre do tempo? Isto é, o pensamento, que é resultado do tempo, pode parar e ficar livre do processo do tempo? O pensamento pode ser controlado, modelado; mas o controle do pensamento está ainda compreendido nos domínios do tempo, e, por isso, a nossa dificuldade é a seguinte: Como pode uma mente, que é resultado do tempo, de milhares de dias passados, livre, instantaneamente, desse complexo acervo de influências? E a verdade é que vocês podem se libertar de tal acervo, não amanhã, porém, no presente, no agora. Isso só é possível ao perceberem aquilo que é falso; e o falso é, obviamente, o processo analítico, e este é a única coisa que temos. Cessando de todo o processo analítico, não mediante compulsão, porém pela compreensão da inevitável falsidade desse processo, verão então que a mente de vocês ficará completamente dissociada do passado — o que não significa que deixarão de reconhecer o passado, porém, que a mente de vocês não terá mais comunhão direta com o passado. Pode, portanto, a mente libertar-se, imediatamente, do passado, e essa dissociação do passado, essa completa libertação do ontem — psicologicamente e não cronologicamente — é possível, e essa é a única maneira de se compreender a realidade. 

Agora, expressando-o de maneira muito simples; quando desejam compreender uma coisa, qual é o estado da mente de vocês? Quando desejam compreender seu filho, quando desejam compreender alguém, ou alguma coisa, qual é o estado da mente de vocês? Não ficam analisando, criticando, julgando o que o outro está dizendo, ficam apenas escutando, não é verdade? A mente de vocês se acha num estado em que o processo do pensamento está inativo, porém muito atento. É exato isso? E essa atenção não se relaciona com o tempo. O que estão é, simplesmente, alertados, passivamente receptivos, mas ao mesmo tempo plenamente atentos; e é só nesse estado que há compreensão. Naturalmente, quando a mente está agitada, interrogando, afligindo-se, dissecando, analisando, não há compreensão. E quando há o desejo ardente de compreender, a mente está evidentemente tranquila. Isto naturalmente vocês terão que experimentar, e não devem aceitá-lo somente porque estou dizendo. Mas é fácil verificar que quanto mais analisam, tanto menos compreendem. Podem compreender certos fatos, certas experiências; mas não é possível esvaziar a consciência de todo o seu conteúdo, por meio do processo analítico. Só é possível isso ao perceberem a falsidade do método analítico. Ao reconhecerem o falso como falso, começarão a ver o que é verdadeiro; e a verdade é que os libertará das influências do passado. Para receber essa verdade, deve a mente desistir de ser analítica, não deve ficar presa ao processo do pensamento, que, evidentemente, é análise, o que nos conduz a outra questão inteiramente diferente, ou seja: O que é meditação correta? — da qual trataremos noutra ocasião. 

Jiddu Krishnamurti — O que te fará feliz? 
23 de janeiro de 1949

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Bem Aventurados os Pobres de Espírito

"Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus;" Mateus V:3

Houve um tempo, há algum tempo, em que, fazendo coro com o que me parecia inteligente, com o que me parecia "normal", eu gostava muito de gente interessante. Nada parecia mais bacana do que conhecer uma pessoa interessante, rica em conhecimento, "com conteúdo" ou, como também se costuma dizer, "pessoas com algo a acrescentar".


Mas, com alguma atenção, foi fácil perceber que as pessoas com muito conteúdo, com elaborados pontos de vista e "muito a acrescentar", no fundo, são as mais pobres. E o são por uma razão muito simples: quanto mais elas têm tais conteúdos, mais elas se confundem com eles e menos elas são elas mesmas.

Hoje, eu aprecio muito mais as pessoas simples, quase e praticamente vazias!! Aquelas que não querem muito, não esperam muito e não almejam muito. Aquelas que têm pouca ou quase nenhuma opinião sobre nada. As que não estão envolvidas em nenhum tipo de ativismo, principalmente os ativismos pessoais. Elas se percebem e percebem a vida de maneira muito mais pura, muito mais clara. Elas enxergam tudo SEM o filtro dos seus conteúdos, dos seus significados e das suas idéias. Elas enxergam o que É!!

segunda-feira, 29 de julho de 2013

O Tatagata

"...Vemos nossa carne e identificamo-nos com nosso corpo. Se alguém diz que nosso corpo não é bonito, ficamos com o complexo de não sermos bonitos. Nosso humor varia e nós nos identificamos com estes sentimentos. Quando estamos tristes dizemos 'Estou triste'. Quando estamos felizes dizemos 'Estou feliz'. Mas nossa verdadeira pessoa não é essas coisas nem algo que está fora delas.

Nós temos nossa verdadeira pessoa, mas não vivemos com nossa verdadeira pessoa, não reconhecemos nossa verdadeira pessoa. Nós só vivemos com as coisas que tomamos por nossa verdadeira pessoa. Vivemos a vida inteira nessa ignorância, pensando que nossos sentimentos e nossa carne são a soma total da nossa verdadeira pessoa. Nossa verdadeira pessoa não está dentro nem fora, não é iludida pelo nascimento e pela morte, por vir e ir, por ter ou não ter, pelo que fazemos ou não fazemos. Quer joguemos xadrez, fiquemos na cama o dia todo ou meditemos a noite inteira, esta não é nossa verdadeira pessoa.

Não podemos encontrar nossa verdadeira pessoa mediante o intelecto ou o raciocínio. Sobre esta pilha de carne vermelha há uma verdadeira pessoa. Quem quer que não tenha visto esta verdadeira pessoa, olhe atentamente. Viva conscientemente. Nossa verdadeira pessoa é nosso próprio Buda milagroso, presente em nossa maravilhosa relação com todas as coisas. Nosso Buda não é nossas cinco skandas, as cinco coisas que compõem um ser humano: forma, sentimentos, percepções, formações mentais e consciência; estas não são a nossa verdadeira pessoa. Nós somos as nuvens, o céu, todos os nossos ancestrais e descendentes. Nossa verdadeira pessoa é uma maravilha. E quando podemos ver isto, nós estamos bem. Ainda temos nossos altos e baixos, mas não nos identificamos com eles, sabemos que somos mais do que isto. Nosso grande êxito é percebermos nossa verdadeira pessoa..."

Thich Nhat Hanh
Trecho de "Nada Fazer, Não Ir a Lugar Algum" - Editora Vozes

Nota: na tradição budista, Tatagata é aquele que vem de lugar nenhum e vai para lugar nenhum. É um nome que o Buda Gautama usava ao referir-se a si mesmo. É o nosso Ser mais profundo e verdadeiro

quinta-feira, 25 de julho de 2013

Torna-te Totalmente vazio!

Torna-te totalmente vazio.
Permite que o teu coração esteja em paz.
Na torrente das idas e vindas mundanas,
vejo os finais tornarem-se inícios.

As coisas florescem, uma a uma,
apenas para voltarem à Origem.
Ao que se é e ao que será.

Regressar à raiz é encontrar a paz.
Encontrar a paz é realizar o destino.
Realizar o destino é ser constante.

Conhecer a constante chama-se visão.
Não conhecer este ciclo
conduz ao desastre eterno.

Conhecer a constante confere perspectiva.
Essa perspectiva é imparcial.
A imparcialidade constitui a
mais elevada nobreza;
a mais elevada nobreza é o Divino.

Sendo Divino, serás uno com o Tao.
Ser uno com o Tao é o eterno.
Este caminho dura para sempre,
não sendo ameaçado pela morte física.

Tao Te Ching
Verso 16

terça-feira, 16 de julho de 2013

A Cada Momento

A cada momento, o Ser Supremo,
a magia e a beleza do Real, começa a abrir sua flor no interior do nosso ser. Mas os medos e as projeções nascidas da ignorância e da identidade limitada com o corpo, a mente e a personalidade ficam no caminho dessa abertura completa. Uma voz aparece do nada e diz: "Eu não posso me dar ao luxo de viver assim. Eu não posso lidar com uma compreensão tão intensa. É muito poderoso. Se eu acolher isso, eu poderia ficar tão radicalmente transformado que a minha vida iria tornar-se incontrolável e imprevisível. Eu poderia tornar-me demasiado inocente para me proteger. Eu não estou pronto para ser vulnerável. Quem, na verdade, é que está resistindo a tal desdobramento da graça? Saiba que é apenas uma auto-imagem e não o seu ser real.
Mooji - 16 de julho de 2013

sábado, 13 de julho de 2013

Sobre o Domingo, o Tempo e o Mundo Bizarro das Interpretações

Como seria a nossa percepção do tempo se os dias da semana não tivessem nomes? Você já se deu conta de que o domingo só é domingo porque alguém, de maneira mera e puramente convencional, resolveu lhe dar esse nome, ou, em outras palavras, resolveu lhe atribuir um significado? Você se dá conta de que, em algum momento, o domingo devia não se chamar domingo, assim como a segunda-feira não tinha esse nome e o respectivo significado? Como explicar, então, o mal que acomete as pessoas que têm a chamada "depressão de domingo" que, inclusive, já é reconhecida como uma doença pela ciência? E se essas pessoas dormissem por dias a fio, a ponto de perder a noção de tempo, e acordassem em pleno domingo, sem que ninguém lhes dissesse que era domingo? Será que, ainda assim, elas teriam "depressão de domingo"? Você se dá conta de que, neste caso, o que deprime essas pessoas não é o dia de domingo em si, mas sim, um nome totalmente convencional, que se conecta a um significado totalmente convencional?

Note o quanto os nomes e suas respectivas significações se interpõem entre você e a sua percepção da realidade! E, por fim, perceba que toda a sua vida se passa dentro de uma intrincada rede de nomes que, por sua vez, acionam uma complexa hierarquia de significados!

segunda-feira, 1 de julho de 2013

Investigue!

Esteja certo de que toda e qualquer pessoa está exatamente onde deveria estar, no estado em que deveria estar, com o fardo e a cruz que deveria ter! E por mais dramática que possa parecer a situação, isto, na verdade, não é nada mais do que parte da brincadeira, da divina dança!! É apenas a consciência criando uma condição que faça o ego sucumbir, a fim de que ela possa se redescobrir.

O que parece dramático e assustador só o é porque você ainda percebe a realidade a partir de uma intrincada, complexa e envolvente teia de conceitos, significados e nomes. Esta é a ação que a mente exerce sobre a sua real natureza: obscurecer, distorcer e colorir o real! Essa é a ilusão.

Mas, quando for a hora certa, esta teia se desvanece, fazendo com que você volte ao seu lugar original, que se situa antes do pensado, antes do nominado, antes do idealizado.

Veja, investigue e perceba a enorme fragilidade de tudo o que você sempre considerou natural, indiscutível, elementar e absolutamente consistente! Não se apegue a nenhuma crença, absolutamente nenhuma, porque todas as crenças e filosofias ocorrem e são possíveis apenas no nível do pensamento e a realidade existe antes disto. E você nunca esteve fora deste lugar.

sábado, 29 de junho de 2013

Uma Entidade Não Pode Alcançar a Iluminação!

Um grupo de três pessoas estava visitando Maharaj pela primeira vez. Embora padecendo na cama e extremamente fraco, Maharaj lhes perguntou se tinham alguma pergunta a fazer.

Eles conversaram entre si e decidiram fazer apenas uma pergunta: “Maharaj, todos nós fizemos certa Sadhana por algum tempo, mas o progresso não parece adequado. O que devemos fazer?”
Maharaj disse que o propósito de qualquer esforço é obter algo, algum benefício que não se possui.

“O que é isto que tentam atingir?” A resposta foi rápida e positiva: “Nós queremos ser como você – iluminados.”

Maharaj riu e se empertigou na cama. Quando estava mais confortável com dois travesseiros para apoiar suas costas, ele continuou: “É nisto que a idéia errada está enraizada: em pensar que vocês são entidades que devem alcançar algo para que possam se tornar como a entidade que vocês pensam que eu sou! Este é o pensamento que constitui a ‘escravidão’, a identificação com uma entidade – e nada, absolutamente nada, exceto a desidentificação causará a ‘liberação’.

Como eu disse, vocês vêem a si mesmos e a mim como entidades, entidades separadas; eu vejo vocês exatamente como me vejo. Vocês são o que eu sou, mas vocês se identificaram com o que pensam ser – um objeto – e buscam a liberação para este objeto. Não é uma enorme piada? Poderia algum objeto ter existência independente e vontade de agir? Poderia um objeto estar escravizado? E liberado?”

O interlocutor juntou suas mãos em namaskar e, muito respeitosamente, sugeriu que o que Maharaj tinha dito não poderia talvez ser questionado como um ideal teórico, mas que, certamente, disse ele, ainda que as pessoas possam ser entidades fictícias, nada mais que meras aparições na consciência, como viveríamos no mundo a menos que aceitássemos as diferentes entidades como suficientemente ‘reais’ na vida?

Esta discussão pareceu animar extraordinariamente o Maharaj, e a debilidade em sua voz desapareceu gradualmente. Ele disse:

“Você vê quão sutil é este assunto? Você respondeu sua própria pergunta, mas a resposta lhe escapou. O que você disse é que você sabe que a entidade como tal é totalmente fictícia e não tem autonomia própria; é apenas um conceito. Mas a entidade fictícia deve viver sua vida normal. Onde está o problema? É muito difícil viver uma vida normal, sabendo que a vida em si é um conceito? Você compreendeu? Uma vez que tenha visto o falso como falso, uma vez que tenha visto a natureza dual do que chama ‘vida’ – que na realidade é viver – o restante será simples; tão simples como um ator desempenhando seu papel com entusiasmo, sabendo que é apenas um papel que ele está desempenhando em uma peça ou um filme, e nada mais.

Reconhecer este fato com convicção, apercebendo-se desta posição, é toda a verdade. O resto é mera atuação.”

De: "Sinais do Absoluto"

Emprestado do blog: www.editoraadvaita.blogspot.com

domingo, 23 de junho de 2013

Você é NADA!

Você é nada! Você sempre foi nada, coisa nenhuma!

É um elogio quando lhe digo isso, não um insulto. Sempre que alguém lhe disser que você é nada, diga muito obrigado. Seja grato a quem lhe disse isso.

Como provar isso para si mesmo? Vivendo neste momento.

Neste momento, não há absolutamente nada acontecendo. Neste momento, em que tudo está calmo, sereno e harmonioso. Mas, assim que você começa a pensar, você estraga a coisa toda.

Assim que você permite que a mente decole e faça alarde com todos os pensamentos, idéias e conceitos você é um ser humano novamente.

Portanto, a prática que você aprende é manter-se silencioso,
para tornar a mente quieta, não causando qualquer conflito.

Robert Adams

Trecho de "The True Teacher Is Within", 1.º de novembro de 1992.

quinta-feira, 20 de junho de 2013

Aquele que É!

“A contemplação é a penetração repentina e intuitiva daquilo que realmente É; o salto inesperado do espírito de uma pessoa para dentro da luminosidade existencial da Realidade em si mesma, não só pela intuição metafísica do ser, mas pela plenitude transcendente de uma comunhão existencial com Aquele que É.”
Thomas Merton - trecho de "The New Man"

Abaixo do Condicionamento


"Todo pensamento obviamente é condicionado. Não existe tal coisa como pensamento livre. Pensar não pode ser livre! É resultado de nosso condicionamento, nosso substrato, nossa cultura, nosso clima, de nosso substrato social, econômico e político.

Os próprios livros que você lê e as próprias práticas que faz são todas estabelecidas no substrato e qualquer pensar deve ser resultado desse substrato. 

Assim, se pudermos estar conscientes e pudermos presentemente ver o que significa, o que quer dizer "estar consciente", talvez sejamos capazes de descondicionar a mente sem o processo da vontade, sem a determinação de não condicionar a mente. 

Porque no momento em que você determina, há uma entidade que quer, uma entidade que diz “Eu devo não condicionar minha mente”. Essa entidade em si é o resultado de nosso desejo de conseguir certo resultado e assim já existe um conflito aí. 

Então, é possível estar consciente de nosso condicionamento, apenas estar consciente? Nisso não há absolutamente conflito. Essa própria consciência, se permitida, pode talvez consumir os problemas."

J. Krishnamurti - trecho de "The Book of Life"

terça-feira, 18 de junho de 2013

Aquilo que Nunca Foi Perdido

O que nunca foi perdido não pode ser encontrado!

A sua própria procura por segurança e alegria o(a) mantém longe de ambos. Pare de procurar, pare de
perder.

A doença é simples e a solução igualmente simples. É apenas a sua mente que faz você inseguro e infeliz. A antecipação faz você inseguro, a memória faz você infeliz.

Pare de abusar da sua mente e tudo ficará bem com você. Você não precisa configurá-la ou ajustá-la, ela se acomodará sozinha, assim que você desistir de toda a preocupação com o passado e o futuro e passar a viver inteiramente no agora!


Nisargadatta Maharaj

quarta-feira, 12 de junho de 2013

That's the Choice!

Você tem essa escolha novamente!

Para perceber que o mundo é um sonho, para deixar tudo sozinho, para estar em paz consigo mesmo e estar em paz com os outros, e apenas observar o mundo sem reagir a ele.

Ou você pode ficar completa e inteiramente envolvido neste mundo, totalmente envolvido no mundo, tentando fazer as coisas acontecerem, tentando tornar-se popular, tornar-se bom, mau, passar por todos os tipos de experiências e sempre lutando pela sobrevivência.

Esta é a escolha! Esta é a escolha que você tem. Esta é a escolha que você tem que fazer. O que você vai fazer?

Robert Adams

You have this choice again.

To realize the world is a dream, to leave everything alone, to be at peace with yourself, and to be at peace with others, and just observe the world without reacting to it.

Or you can get completely and fully involved in this world, totally involved in the world, trying to make things happen, trying to make yourself popular, make yourself good, bad, go through all kinds of experiences, and always fighting for survival.

This is the choice you've got. This is the choice you have. This is the choice that you have to work with. What will you do with it?

Robert Adams

Nota: Robert Adams é americano e foi um dos mais importantes discípulos ocidentais de Ramana Maharshi

domingo, 9 de junho de 2013

O Zen e o Nada!

"...então, se você for em frente e verificar, se debruçar sobre o fato de como você se sente ante a perspectiva de desaparecer para sempre. Todos os seus esforços, todas as suas realizações e todas as suas expectativas simplesmente sumindo, virando poeira! Como você se sente? O que acontece?

É uma coisa curiosa, mas, se você examinar, o estado mais real, mais sem esforço, é o estado de vazio! O estado de nada! É isso que tudo se tornará! E por uma razão ou outra, nós fomos ensinados a temer este estado. A considerá-lo deprimente.

Mas se alguém argumentar que a realidade básica não é a não-existência, então, de onde vem tudo isso? Obviamente, da não existência! Então, alegre-se!! É isso o que os ensinamentos do Buddha querem dizer quando afirmam que, na verdade, nós somos basicamente nada!

A essência da sua consciência, tal como ela é por detrás dos seus olhos, é intrinsecamente pura*! Mas puro, não no sentido "não-sujo", como normalmente se interpreta a palavra pureza! Puro no sentido de claro! Vazio!

Você conhece a história de quando o sexto Patriarca do Zen decidiu escolher seu sucessor? Houve um concurso de poesia e o perdedor escreveu um poema que sugeria que a mente é como um espelho que precisa ser polido! Que a mente precisa ser permanentemente polida para que a poeira não se assente. Para que permaneça limpa.

Mas o ganhador escreveu um poema que dizia mais ou menos o seguinte: não há espelho algum, e a natureza da consciência é intrinsecamente vazia! Onde a poeira poderia se assentar, então?

Ao ver que o vazio é a realidade fundamental, que ele é a sua realidade, como, então, alguma coisa pode lhe afetar? Como ela pode contaminá-lo?

Toda e qualquer ideia sobre você assustado, apreensivo, sacrificado. Tudo isso é apenas isso: uma ideia! Porque você é realmente nada!

Mas eu não estou falando de um nada qualquer! Você é o nada mais incrível! Se você concebe este "nada" como ausência de existência e isso lhe deixa apreensivo e amargurado, então, você não entendeu!

Este nada, este vazio, ele é como o vazio do espaço, que contém todo o universo! O Sol, a Lua, as estrelas, as montanhas, os rios, os homens bons e os homens maus. Os animais! Tudo, todos estão contidos no vazio. Então, este vazio é de onde tudo surge, e você é ele!

Então, o que eu estou mostrando é que toda essa tolice sobre o medo da não-existência é que, falando a verdade, nós nos referimos à não existência quando falamos de espiritualidade. Mas você ignora, rejeita e desdenha desta não existência! Você diz: Oh! Não existência! Credo! Que os céus nos protejam disto!

Mas, aí é que está o segredo da existência! E, obviamente, o segredo sempre está onde nós nunca pensamos em procurar."

Alan Watts

Tradução livre do autor do blog

* No Zen, a palavra "pureza" não deve ser compreendida com o mesmo sentido que lhe é dado nas tradições religiosas ocidentais, isto é, no sentido de uma pureza pessoal, de um "tornar-se purificado"! Para o Zen, em específico para a escola Rinzai, também conhecida como "Escola do Sul", originada a partir do Sétimo Patriarca, chamado Hui Neng, a pureza tem um sentido muito mais existencial. Ao invés de apontar para um "eu melhorado", uma versão aprimorada e beatificada da pessoa, ela aponta para o fim da pessoa, para a própria transcendência do eu psicológico. 

sexta-feira, 7 de junho de 2013

Reconheça o Falso!

..Pergunta: Uma vez que tenha decidido encontrar a Realidade, o que farei depois?

Mararaj: Depende de seu temperamento. Se você for sério, qualquer caminho que escolher o levará a sua meta. É a seriedade o fator decisivo.

P: E o que me amadurecerá? Necessito de experiência?

M: Você já teve toda a experiência de que necessita. Você não precisa acumular mais, em vez disto você deverá ir além da experiência. Qualquer esforço que fizer, qualquer método que seguir, meramente gerará mais experiência, mas não o levará além. Nem a leitura de livros o ajudará. Eles enriquecerão sua mente, mas a pessoa que você é permanecerá intacta. Se esperar qualquer benefício de sua busca material, mental ou espiritual, você errará o alvo. A verdade não dá nenhuma vantagem. Não lhe dá um status mais elevado, nenhum poder sobre os outros; tudo o que você obtém é a verdade e a liberdade do falso.

P: Seguramente, a verdade me dará o poder para ajudar outros.

M: Isto é mera imaginação, de qualquer forma nobre! Na verdade, você não ajuda outros porque não há outros. Você divide as pessoas em nobres e ignóbeis e você pede ao nobre que ajude o ignóbil. Você separa, avalia, julga e condena – em nome da verdade você a destrói. Seu próprio desejo de formular a verdade a nega, porque ela não pode ser contida em palavras. A verdade só pode ser expressa pela negação do falso – em ação. Para isto você deve ver o falso como falso e rejeitá-lo. A renúncia do falso é libertadora e dá energia. Abre o caminho para a perfeição.

P: Quando saberei que descobri a verdade?

M: Quando a ideia “isto é verdadeiro”, “aquilo é verdadeiro”, não surgir. A verdade não afirma a si mesma, ela está na visão do falso como falso e em rejeitá-lo. É inútil buscar a verdade quando a mente estiver cega ao falso. Deverá ser purificada completamente do falso antes que a verdade possa despontar em você.

P: Mas o que é falso?

M: Certamente, o que não tem nenhum ser é falso.

P: O que você quer dizer por não ter nenhum ser? O falso existe, duro como um prego.

M: O que se contradiz não tem ser. Ou só o tem momentaneamente, o que vêm a ser o mesmo. Pois o que não tem um princípio e um fim não tem nenhum meio. É um oco. Só tem um nome e uma forma dados pela mente, mas não tem nem substância nem essência.

P: Se tudo que passar não tem ser, então o universo não terá nenhum ser tampouco.

M: Quem o negou? Certamente, o universo não tem ser.

P: O que tem?

M: Aquilo que não depende de nada para sua existência, que não surge quando surge o universo nem se põe quando o universo se põe, que não necessita de qualquer prova, mas dá realidade a tudo que toca. A natureza do falso é parecer real por um momento. Pode-se dizer que a verdade torna-se o pai do falso. Mas o falso está limitado no tempo e no espaço e é produzido pelas circunstâncias.

P: Como me liberto do falso e obtenho o real?

M: Com que propósito?

P: Para viver uma vida melhor, mais satisfatória, integrada e feliz.

M: O que quer que seja concebido pela mente deve ser falso, pois é obrigado a ser relativo e limitado. O real é inconcebível e não pode ser aparelhado para um propósito. Deve ser desejado por si mesmo.

P: Como posso querer o inconcebível?

M: O que mais é digno de desejo? Concordo, o real não pode ser desejado como uma coisa é desejada. Mas você pode ver o irreal como irreal e descartá-lo. É o descarte do falso que abre o caminho para o verdadeiro.

P: Entendo, mas como se parece na vida diária atual?

M: O interesse próprio e o egocentrismo são os pontos focais do falso. Sua vida diária vibra entre o desejo e o medo. Observe-a atentamente e verá como a mente assume inumeráveis nomes e formas, como um rio espumante entre as pedras. Siga o motivo egoísta em cada ação e olhe-o atentamente até que se dissolva.

P: Para viver se deve cuidar de si mesmo, deve-se ganhar dinheiro para si mesmo.

M: Não necessita ganhá-lo para si mesmo, mas pode ter que ganhá-lo para uma esposa ou um filho. Pode ser que deva seguir trabalhando para os outros. Mesmo só manter-se vivo pode ser um sacrifício. Não há nenhuma necessidade de ser egoísta. Descarte todo motivo egoísta logo que o veja e não necessitará buscar a verdade; a verdade o encontrará.

P: Há um mínimo de necessidades.

M: Não foram satisfeitas desde que você foi concebido? Abandone a escravidão do egoísmo e seja o que é – inteligência e amor em ação.

P: Mas se deve sobreviver!

M: Você não pode contribuir para a sobrevivência! Seu ser real é eterno e está além do nascimento e da morte. E o corpo sobreviverá enquanto for necessário. Não é importante uma vida longa. Uma vida plena é melhor que uma longa vida.

P: Quem vai dizer que é uma vida plena? Depende de meu fundo cultural.

M: Se você buscar a realidade, deverá se libertar de todos os antecedentes, de todas as culturas, de todos os padrões de pensamento e sentimento. Mesmo a ideia de ser um homem ou uma mulher, ou mesmo humano, deve ser descartada. O oceano da vida contém tudo, não apenas os humanos. Assim, em primeiro lugar abandone a auto-identificação, pare de pensar de si mesmo como assim e assado, esse e aquele, isto ou aquilo.

Abandone todo interesse próprio, não se preocupe com seu bem-estar, material ou espiritual, abandone todo desejo grosseiro ou sutil, deixe de pensar em avanços de qualquer tipo. Você é completo aqui e agora, não necessita absolutamente de nada. Isto não quer dizer que deva ser tolo e imprudente, imprevidente ou indiferente; apenas a ansiedade básica por si mesmo deve cessar. Você necessita algum alimento, roupa e abrigo para você e para os seus, mas este desejo não cria problemas enquanto a ambição não passar por necessidade. Viva em sintonia com as coisas como elas são e não como são imaginadas.

P: O que sou eu se não um ser humano?

M: Aquilo que o faz pensar que você é humano não é humano. Não é senão um ponto de consciência sem dimensão, um nada consciente; tudo o que pode dizer sobre si mesmo é: “eu sou”. Você é puro ser – Consciência – bem-aventurança. Compreenda que este é o fim de toda busca. Você chega a ele quando vir que tudo o que pensa sobre si mesmo é mera imaginação, é permanecer distante, na pura consciência do transitório como transitório, do imaginário como imaginário, do irreal como irreal. Isto não é de forma alguma difícil, mas o desapego é necessário. É o apego ao falso que faz tão difícil a visão do verdadeiro. Uma vez que entenda que o falso precisa de tempo e que necessitar de tempo é falso, você estará mais próximo da Realidade, a qual é eterna, sempre no agora. A eternidade no tempo é mera repetição, como o movimento de um relógio. Flui do passado para o futuro interminavelmente, uma perpetuidade vazia. A Realidade é que faz o presente tão vivo, tão diferente do passado e do futuro, os quais são meramente mentais. Se você precisar de tempo para alcançar algo, deverá ser falso. O real está sempre com você; não precisa esperar para ser o que você é. Apenas não deve permitir que sua mente saia de você mesmo na busca. Quando quiser algo, pergunte a si mesmo: realmente necessito disto? E, se a resposta for não, então meramente o abandone.

P: Não devo ser feliz? Posso não necessitar de algo, mas se puder me fazer feliz não deverei pegá-lo?

M: Nada pode lhe fazer feliz mais do que é. Toda busca de felicidade é miséria e leva a mais miséria. A única felicidade digna do nome é a felicidade natural de ser consciente.

P: Quer dizer que devo abandonar toda ideia de uma vida ativa?

M: Não, de forma alguma. Haverá casamento, filhos, ganhar dinheiro para manter a família; tudo isto acontecerá no curso natural dos eventos porque o destino deve cumprir-se; você passará por isto sem resistência, confrontando as tarefas como vierem – interessada e completamente –, nas pequenas e grandes coisas. Mas a atitude geral será de carinhoso desapego, enorme boa vontade, sem esperar retorno, dando constantemente sem nada pedir. No casamento, você não é nem o marido nem a esposa; você é o amor entre os dois. Você é a clareza e a bondade que tornam tudo ordenado e feliz. Pode parecer vago para você, mas, se pensar um pouco, descobrirá que o místico é o mais prático, pois faz com que sua vida seja criativamente feliz. Sua consciência é elevada a uma dimensão superior, da qual se vê tudo muito mais claramente e com maior intensidade. Você compreenderá que a pessoa que você se tornou no nascimento, e que cessará de ser na morte, é temporária e falsa. Você não é a pessoa sensual, emocional e intelectual, oprimida por desejos e temores. Descubra seu ser real. O “que sou eu?” é a questão fundamental de toda filosofia e psicologia. Vá profundamente para dentro dela.

Nisargadatta Maharaj - Do livro "Eu Sou Aquilo"
Trecho retirado do Blog "O Todo é UM"

Nota: é muito comum que, ao se deparar com textos do advaita vedanta e do zen, o leitor ocidental sinta-se desconcertado, assustado e até indignado ante a afirmação crua - recorrente nestas sabedorias - de que a realidade material não passa de uma ilusão. É falsa.

É importante esclarecer que, nestes escritos, as palavras "ilusão" e "falso" não têm a conotação usualmente empregada no ocidente. Assim, por exemplo, "ilusão" não deve ser entendida no sentido de uma ilusão de ótica, uma espécie de miragem, mas, no sentido de impermanente, passageiro, instável, etc. Da mesma forma, o "falso", nestes textos, é utilizado para indicar algo - crenças, conceitos, idéias, etc - que foi adquirido e assimilado de maneira indiscutida, não examinada, não verificada. 

quinta-feira, 6 de junho de 2013

A Verdade!


"Conhecei a verdade e a verdade vos libertará!"



Que verdade é esta? E do quê ela nos libertará?

Não se contente com o que lhe disseram! Não se contente em simplesmente crer!
Examine! Constate! Verifique!

terça-feira, 4 de junho de 2013

Ação e Idéia

Uma das atividades mais tiranicas da manutenção do ego consiste em converter a experiência em ideias que proporcionem segurança na ação. Qualquer experiência, por mais nobre e autentica que tenha sido, é atraiçoada quando a procuras cristalizar numa ideia. É egoísmo procurar agir em conformidade com o amor e altruísmo Se procuras ser consistente com uma ideia de liberdade, então não és livre, és escravo. Não podes ser livre se a tua ação se processa em obediência a uma ideia. Na liberdade não está presente a obediência ou conformidade. A liberdade é ausência de ideia. A ação livre é sempre espontânea! A ideia gera uma separação entre aquilo que tu és e aquilo que procuras aparentar. A ideia é qualquer coisa de alheio àquilo que de forma mais autentica tu és. Um peixe não tem que atuar como um peixe para ser um peixe. Se há uma imagem em conformidade com a qual procuras atuar, então existe uma separação e negação daquilo que és!

O ego pode apropriar-se de qualquer exposição verbal ou simbólica, por mais rigorosa, perfeita ou bem concebida. A sua infinita capacidade de metamorfose pode tomar a forma até do suposto ensinamento que o pretende eliminar. Daí a necessidade de abandonar o barco que nos tenha conduzido à outra margem. Por mais sólido e útil que tenha sido durante a travessia, uma vez alcançada a outra margem, não faz sentido carregar o barco às costas. Quando caminhamos em terra firme, o barco torna-se um estorvo e uma carga inútil! Que utilidade pode ter um mapa uma vez que já vimos claramente o tesouro? Continuar a interpretar, aperfeiçoar, completar ou idolatrar o mapa só pode resultar num esforço inútil e num inútil dispêndio de energia.

Sempre que uma compreensão se cristaliza num conceito mental com o qual eu procuro conformar a minha vida, de acordo com o qual eu procuro agir e adaptar a minha ação, então o ego modificou-se para poder sobreviver. Se uma compreensão, experiência ou ensinamento espiritual, por mais elevado que seja, resulta numa aquisição (sabedoria, crença,doutrina, ensinamento, etc.), então o ego ressurge sob nova roupagem. A libertação só é real quando aquilo que se perde não é substituído por mais elevada, sublime ou lucrativa que pareça a substituição e por mais sagrado que seja o objeto substituto. A renuncia e o desapego tem que ser absoluto e incondicional. A melhor coisa não é melhor do que nada, diz a sabedoria Zen. Por mais forte que seja a atração pela certeza e segurança, este impulso ou desejo, é o principal e mais sutil sustento do ego. 

Sempre que uma crença é substituída por outra, não importa se falsa ou verdadeira, então o ego encontrou uma nova forma de apoio e sustento. O importante é o abandono de toda a crença, de todo o desejo de segurança. Trata-se de abraçar a insegurança e a incerteza, ou antes, de não lhes procurar fugir. De permanecer no silêncio e no vazio! Só então é possível contatar com uma dimensão que nada tem a ver com as formulações do intelecto nem com as maquinações ilusórias da mente. Só então a ação acontece desde uma percepção lúcida e directa da realidade. O impulso à segurança é muito forte e subtil. É a principal origem e sustento do ego e necessita vigilância constante. Porque o ego de tudo pode colher alimento, inclusive dos ensinamentos do mais santo, do mais sábio e bem intencionado guru ou profeta. Na presença do ego, qualquer céu se pode converter num inferno, na sua ausência tudo é invadido pela paz, pelo paraíso e bem aventurança.

Observa a forma que tem a tua resposta a este momento presente. Como lhe correspondes? Tomas como pressuposto que existe a forma correta, adequada, perfeita de responder ao desafio? Possuis armazenada ao nível conceptual uma formula ou receita que agora procuras aplicar? A tua ação é comandada, dirigida por uma ideia elaborada, uma verbalização, um conceito que armazenaste devido ao teu desejo de perfeição? A tua ação tem a proteção e mediação de uma ideia não importando o rigor ou a santidade da sua proveniência? Ou pelo contrário, te permites apresentar perante o desafio de uma forma completamente desarmada e vulnerável, quer dizer, de uma forma nua, direta, completamente despida e desprotegida? Se a tua busca e aprendizagem resultou numa fórmula e se cristalizou num conceito na base do qual procuras atuar, então permaneces cego e invulnerável à realidade. Porque a realidade deste momento presente é o desconhecido. E o desconhecido não pode ser captado por qualquer conceito. Só o podes contactar se a tua mente, os teus conceitos não se interpuserem. Se não o procuras enformar dentro das tuas crenças e conhecimentos. Apenas a consciência, quer dizer, o amor, pode receber a realidade. E o amor significa na verdade a tua ausência. Só quando tu não estás é que a verdade pode brilhar!

Pedro Fonseca

www.jardimdepicuro.blogspot.com

segunda-feira, 3 de junho de 2013

A Consciência

A consciência é a única porção de você que é permanentemente presente, contínua, nunca sujeita a falhas e intervalos! No gaps! Entretanto, por ela lhe ser tão íntima e familiar, você perdeu a capacidade de percebê-la! É para isto, para esta auto-percepção, para a capacidade de dar-se conta desta consciência que todas as abordagens espirituais - o zen, o vedanta, o tao, a kabbalah e o próprio cristianismo (original e não corrompido) - apontam há milênios!

É a esta perda da capacidade humana de ser e estar consciente da consciência que, metafórica e alegoricamente, a Bíblia se refere quando fala da saída de Adão do Paraíso! É a ela que, com alguma atenção, percebe-se que Jesus se refere no novo testamento.

Mas, a perda da capacidade de perceber a consciência, de perceber-se consciente, por si, não fez com que ela deixasse de estar presente e atuar! Ela nunca deixou de nos prover com o nosso senso de existência!

E, ao contrário do que parece, ela não está situada na sua cabeça! Esta impressão se deve apenas ao fato de que, na sua esmagadora maioria, as pessoas confundem consciência com percepção sensorial. E, como a quase totalidade dos orgãos sensoriais está localizada na cabeça, nasceu este equívoco! Na verdade, a consciência é não local! Ela é suprema, é o substrato de toda e qualquer experiência! Ela é o pano de fundo que permite a cognição! Ela é a sua mais essencial essência!!

Dê-se conta desta consciência, que é você, de verdade, e constate que, sendo "o que" percebe, ela é necessariamente maior do que tudo o que é percebido! Este é o fim do sofrimento, o salto, o portão estreito que leva à salvação, como dizia Jesus!

sábado, 1 de junho de 2013

O Cristianismo e a Não-Dualidade II

"Desconfie sempre que alguém criar uma distância entre você e Deus e, prontamente, se oferecer como intermediário"

Estas sábias palavras de Nisargadatta Maharaj, um dos mais claros e expressivos mestres do vedanta, refletem a postura franca e deliberadamente adotada pela igreja ocidental quanto à natureza da relação existente entre o homem e deus: deus lá, você cá e eu no meio. É a dualidade na sua melhor expressão!

Mas, não foi sempre assim! Desde tempos remotos, inúmeros cristãos, muitos deles oficialmente vinculados à igreja, rebelaram-se contra esta visão dualista - e comercialmente muito inteligente e oportuna - oficialmente professada pela igreja secular e, em franca oposição à religiosidade dogmática, lançaram mão da livre investigação e do exame pessoal para, a partir da experiência direta, constatar a existência da não-dualidade claramente apontada nos ensinamentos originariamente professados pelo Cristo.

Pode-se mencionar muitos destes místicos cristãos: São João da Cruz, Santa Tereza de Ávila, São Gregório de Nissa, São Francisco de Assis, etc. Mas, entre eles todos, nenhum se referiu tão claramente à percepção direta de Deus quanto Mestre Eckhart. Nas suas tentativas de descrever o inefável, ele (involuntariamente, é claro!) praticamente reproduz e repete relatos, descrições e diretrizes existentes nas escrituras do Vedanta e nos pouquíssimos registros escritos do Zen.

Abaixo, a transcrição de dois trechos de suas obras (grifos e destaques do autor):

"Mudei-me portanto em Deus e Ele me fez um consigo, e assim, pelo Deus vivo, não há distinção entre nós... Algumas pessoas imaginam que vão ver Deus, que verão Deus como se Ele estivesse além e elas ali, mas não é assim. Deus e eu: somos um. Conhecendo Deus, tomo-o para mim. Amando a Deus, penetro-o"

"O princípio não tem outra razão que o fim, pois no fim último repousa tudo que jamais foi dotado de razão. O fim último do ser são as trevas ou o não conhecimento da divindade escondida, onde a luz ilumina .... Aquele que é sem nome, que é a negação de todos os nomes, e jamais teve um nome. .... No fundo da alma, o Fundo de Deus e o fundo da alma sendo senão um só e mesmo fundo. Quão mais Te procuramos, menos Te encontramos. Tu deverás procurá-lo de forma que jamais o encontre; se tu não o procurares, encontrá-lo-á."

É claro que não só Mestre Eckhart, mas, todos os demais místicos cristãos foram perseguidos pela Igreja. Entretanto, felizmente, muito dos registros deixados por eles sobre a experiência direta de Deus sobrevieram até os dias atuais, para mostrar que, na sua essência, na sua mais perfeita consonância com os ensinamentos originários do Cristo, o Cristianismo aponta diretamente para a mesma direção do Vedanta, do Zen e do Tao: para a não-dualidade! Para o fato de que a suposta separação entre Deus e o homem é apenas conceitual e imaginada. Não é mais que uma ilusão (mahamaya) que, graciosa e puerilmente, se perpetua devido a uma espécie de loop da mente!

Caso você queira mais posts que apontem para a incrível semelhança do cristianismo com o Vedanta e o Zen, escreva!

segunda-feira, 27 de maio de 2013

You Are a Buddha!!


"Retorne à sua essência como existência pura. Nenhuma psicanálise aqui. Apenas uma pílula de liberdade. Nada pode expressar o que você é. Você não é nem 'isto' nem 'aquilo'. Na verdade, você não é alguém, nem algo. Quero encontrar você, mas não sua história. Será um magnífico encontro. Deixe este esconderijo vacilante, esta forma humana cheia de dramas. Eu sei quem você é. Você é um Bhudha..!"

Mooji

quarta-feira, 22 de maio de 2013

A Meditação do Ser



"Um lampião que está aceso pode apagar se o vento estiver forte. Se você quiser vê-lo novamente, você tem que reacendê-lo. Mas o Ser não é assim. Ele não é uma chama que pode ser apagada pela passagem dos ventos dos pensamentos e desejos. Ele é sempre luminoso, sempre brilhante, está sempre lá. Se você não está consciente dele, isso significa que você colocou uma cortina ou um véu na frente dele que bloqueia sua visão. O Ser não oculta a si mesmo atrás de uma cortina. É você que coloca a cortina lá ao acreditar em ideias que não são verdadeiras. Se a cortina se abre e então se fecha novamente, isso que dizer que você ainda está acreditando em ideias erradas. Se você as erradicou completamente, elas não reaparecerão. Enquanto essas ideias estiverem cobrindo o Eu Real, você ainda precisa fazer constante sadhana.
Então, voltando à sua questão, o Eu Real não precisa estabilizar-se. Ele é pleno e completo em si mesmo. É a mente que pode ser estabilizada ou desestabilizada, não o Ser."


Trecho de: "Os Ensinamentos Finais de Annamalai Swami” 

Retirado de www.advaita.com.br

domingo, 19 de maio de 2013

Solidão

"O ser humano ainda não aprendeu a conhecer as belezas da solidão. Ele está sempre ansiando por algum relacionamento, ansiando por estar com alguém... e esquece, de alguma maneira, que está só. Que nasceu só, que morrerá só e, não importa o que faça, você vive só.

A solidão é algo tão essencial a seu ser que não há maneira de evitá-la. Todos os esforços dirigidos a evitar a solidão falharam e falharão, porque são contrários a que você se torne consciente de sua solidão. E é tão

lindo experienciá-la, senti-la, porque ela o liberta da multidão, do outro. É a nossa libertação do medo de estarmos sós. "Solidão" significa simplesmente ser completo. Você é inteiro, não precisa de ninguém mais para completá-lo.

Assim, tente descobrir seu centro mais profundo, onde você está sempre só, sempre esteve só... tão pleno, tão completo e tão transbordante com todas as seivas da existência que, tendo provado sua solidão, a dor do coração desaparecerá. Em seu lugar, um novo ritmo de imensa suavidade, paz, alegria e bem-aventurança estará presente.

Isso não significa que uma pessoa que está centrada em sua solidão não possa fazer amigos. Na realidade, só ela pode fazer amizades, porque agora isso não é mais uma necessidade, é simplesmente um compartilhar."


Pepitas de Ouro - Editora Gente