quarta-feira, 27 de março de 2013

Entrega é Compreensão

Questionador:

Querido Osho,
Percebo que quando me entrego, faço isso para poder alcançar a minha meta. Eu busco me entregar para obter a LIBERDADE, então penso que minha entrega não se trata de uma entrega verdadeira. Eu consigo testemunhar isso, mas o problema é que é justamente este “eu” que está testemunhando. Portanto, tudo o que decorre a partir desse “eu” que testemunha só pode ser um reforço para o ego. Eu me sinto enganada pelo meu ego.

Osho:

Você ainda não entendeu o que é a entrega.

A primeira coisa a lembrar sobre a entrega é: você não pode fazê-la; a entrega não é um fazer. Você pode evitar o seu acontecimento, mas você não pode fazer com que ela ocorra. Ela está além do alcance de nosso fazer. O poder que temos sobre a entrega é apenas negativo: temos o poder de impedi-la, mas não temos o poder de fazer com que ela aconteça.

Entregar-se não é algo que você possa fazer. Se você puder, não se trata de entrega, porque o fazedor está presente. A entrega/rendição é um grande entendimento de que “eu não sou”. A rendição é uma visão (insight) de que o ego não existe, de que “eu não estou separado”. A entrega não é um ato, mas uma compreensão.

Em primeiro lugar você é falso, a separação é falsa. Nem por um único momento você pode existir separado do universo. A árvore não pode existir se estiver desenraizada/desligada da terra. A terra não pode existir se o sol desaparecer amanhã. A árvore não pode existir se água não estiver chegando às suas raízes. A árvore não pode existir se não puder respirar. A árvore está enraizada em todos os cinco elementos – aquilo que os budistas denominam Skandhas. Avalokita... quando Buda chegou à visão transcendental, depois de ter passado por todos os estágios e ter ido além do mundo – de lá ele olhou para trás – o que ele viu? Ele viu apenas cinco agregados (acúmulos, combinações) com nada de substancial neles, apenas o vazio, shunyata.

A árvore não poderia existir sem que esses cinco elementos estivessem constantemente vertendo energia para ela. A árvore é apenas uma combinação desses cinco elementos. Se árvore começar a pensar “eu sou”, então haverá miséria para ela. E ela criaria um inferno para si mesma. Mas as árvores não são assim tão tolas, elas não carregam qualquer mente. Elas estão lá, e se amanhã elas desaparecerem, então simplesmente desapareceram. Elas simplesmente não se apegam, porque não existe um “alguém” para apegar-se. A árvore está constantemente entregue à existência. Por “entrega” quero dizer que ela nunca está separada, que nunca ocorreu a ela essa idéia estúpida de ego. E assim são os pássaros, as montanhas, as estrelas. Foi somente o homem que transformou a sua grande oportunidade de estar consciente para um estado de consciência-de-si-mesmo. Ser simplesmente consciente, ao invés de consciente de si mesmo – é disto que estou falando. O ser humano é dotado de consciência. Se a consciência floresce e se expande, ela pode trazer-lhe a maior felicidade possível. Mas se alguma coisa der errado e a consciência azedar, convertendo-se em consciência-de-si-mesmo, então um inferno é criado, a miséria é criada. Ambas as alternativas estão sempre abertas; cabe a você escolher.

A primeira coisa a ser entendida sobre o ego é que ele não existe. Ninguém existe na separação. Você é tão UM com o universo como eu sou, como Buda é, como Jesus é. Eu sei disso, você não sabe disso ainda. A diferença é apenas de reconhecimento. A diferença não é existencial, absolutamente não é! Assim, o que você tem de fazer é olhar e investigar essa idéia estúpida de separação. Agora, perceba que ao tentar se entregar você ainda está carregando a idéia de separação. Você está pensando “eu vou me entregar, agora eu vou me render”. Na entrega não existe nenhum “eu” – mas você pensa que existe. Isso arruinará todos os seus esforços.

Explorando e investigando detalhadamente a idéia de separação, um dia você descobre que não está separado; assim, como você pode se entregar? Não há ninguém para se render! Nunca houve! Aquele que realiza a entrega simplesmente não existe, não está em lugar nenhum. Se você for para dentro de si mesmo, não encontrará em parte alguma um “eu” que possa se render. Esse é o momento em que afinal ocorre a rendição. Quando o “eu” que realiza a entrega não é encontrado (porque chegou-se à compreensão de que ele não existe), esse é o momento em que ocorre a entrega. Você não pode fazer. Se puder fazê-lo, trata-se de uma coisa falsa. E da falsidade decorre somente mais falsidade. Ao carregar a idéia “eu existo, eu sou” você é falso; por isso qualquer coisa que vier a fazer também será falsa. E uma falsidade leva à outra, que por sua vez conduz à outra, e assim por diante. Dentre todas a falsidade mais fundamental é o ego, a idéia “eu estou separado”.

Você diz: “eu me entrego para poder alcançar o meu objetivo.”

O ego está sempre orientado para um objetivo. É sempre ganancioso, está sempre se agarrando a algo. Ele está sempre em busca de mais e mais e mais; é essa ideia de “mais” que sustenta a vida do ego. Se você tem dinheiro, ele almejará ter mais dinheiro; se você tiver uma casa, ele desejará ter uma casa maior; se você tem uma mulher, o ego desejará uma mulher ainda mais bela. O ego sempre quererá mais. Ele tem uma fome incessante. O ego vive no futuro e no passado. Quando o ego está vivendo no passado, ele vive como um colecionador – “eu tenho isto, mais isto e aquilo outro”. Ele sente uma grande satisfação. “Eu tenho isto” – poder, prestígio, dinheiro. Essas coisas conferem um tipo de realidade a ele. Elas dão a ele a noção de que “se eu possuo estas coisas, então eu devo estar ali”; devido a tais coisas o ego consegue dizer “eu existo”. E quando o ego está vivendo no futuro, ele o faz através da idéia de “mais, mais e mais”. Assim, ele vive da memória e também do desejo.

O que é um objetivo? É um desejo: “eu tenho que chegar lá, tenho que ser aquilo, tenho que alcançar.” O ego não consegue viver no presente, porque o presente é real e o ego é irreal – eles nunca se encontram. O passado é irreal, simplesmente não existe mais. O passado já foi real, mas enquanto ele estava presente o ego não estava lá. Tão logo tenha desaparecido, ele perde a qualidade de ser existencial, e o ego imediatamente passa a colecionar e a acumulá-lo. O ego agarra e acumula coisas mortas. O ego é um cemitério: recolhe cadáveres e ossos mortos.

Ou ego também vive no futuro. Mais uma vez, o futuro também é não existencial; o futuro ainda não é – é apenas imaginação, fantasia, sonho. O ego também pode viver através disso muito facilmente. Uma falsidade harmoniza-se muito bem com outra falsidade; todas as falsidades combinam perfeitamente. Traga qualquer coisa existencial e o ego logo desaparece. Por isso a insistência para que você esteja no presente, no aqui e no agora. Apenas este momento... Se você for inteligente, poderá dispensar todo e qualquer pensamento acerca do que agora estou falando, perceberá que aquilo sobre o qual estou discorrendo não é para ser pensado ou analisado, mas simplesmente visto com intensidade e totalidade neste exato momento. Uma visão intensa, alerta, penetrante, focada, direta, imediata, abrangente, total... e onde está o ego? Há apenas um grande silêncio, nenhum passado existe, nenhum futuro existe, apenas este momento está aqui . Então este momento “é” e você “não é”. Permita (autorize) que este momento seja e você não seja. Sentirá um silêncio imenso, um silêncio profundo, dentro e fora. E então não haverá nenhuma necessidade de se entregar, pois você se alinhou com a verdade de que na realidade você não existe, você não é – apenas o momento presente é. Essa compreensão em si realiza a entrega. Entregar-se significa compreender verdadeiramente que você “não é”.

Não é uma questão de que você tenha de entregar-se a mim, ou de que você tenha que entregar-se a Deus. Não é sequer uma questão de que você tenha de entregar-se, absolutamente. A entrega é um insight, uma compreensão de que “eu não sou”. Percebendo que “eu não sou, eu sou um nada, eu sou um vazio”, a entrega aumenta cada vez mais. A flor da entrega cresce na árvore da vacuidade. Ela jamais pode estar orientada para o cumprimento de um objetivo.

Na natureza do ego é estar orientado para um objetivo. Ele anseia pelo futuro. Ele pode ansiar até mesmo pela outra vida, pode ansiar pelo céu, pelo nirvana. Não importa aquilo pelo qual o ego anseia – ansiedade é sempre ansiedade, desejo é sempre desejo, tudo isso está sendo projetado no futuro.

Perceba isso! Perceba de uma só vez a totalidade do mecanismo da mente. Eu não estou dizendo “pense sobre isto”. Se você pensar, terá errado o alvo. Novamente, o pensar tem a ver com o passado e futuro. Olhe atentamente para isso, e perceba! Faça isso, e faça agora! Não diga a si mesmo: “ok, farei depois que chegar em casa”. Se você adiar, o ego apareceu, o objetivo surgiu, o futuro entrou. Todas as vezes que você envolver o tempo, estará caindo na armadilha da separação.

Permita que o momento esteja aqui, apenas este momento. E então você percebe o que você é – você está aqui, você não vai a lugar algum, e você não está vindo de lugar nenhum. Você sempre esteve aqui. Aqui é o único momento, o único espaço. Agora é a única existência. É neste Agora que existe a rendição.

“Eu me entrego para alcançar o meu objetivo”, você diz. “Eu busco me entregar para obter a liberdade.”

Mas você é livre! Jamais você esteve aprisionada. Você é livre, mas de novo há o velho problema: você deseja a liberdade, mas não compreende que você só pode ser verdadeiramente livre quando for livre de si mesma – não existe outra liberdade além dessa. Todas as vezes que você pensa sobre a liberdade, você imagina que o seu “eu” estará lá e será livre. Mas você não vai estar lá, somente a liberdade estará. Liberdade significa que liberdade do próprio “eu”, ao invés de “liberdade usufruída pelo eu”. No momento em que a prisão desaparece, o prisioneiro também desaparece, porque o prisioneiro é a prisão! Prisioneiro e prisão são um. No momento em que você deixar a prisão, você também não será. Haverá apenas um puro céu, puro espaço. Esse espaço puro é chamado nirvana, moksha, liberação.

Compreenda o que é liberdade, ao invés de tentar obtê-la.

“Eu busco me entregar para obter a liberdade.”

Nesse caso, você está usando a entrega como um meio, enquanto que a entrega é o objetivo, é o fim em si mesmo. Quando eu digo que a entrega é a nossa meta, não estou dizendo que a entrega tem de ser alcançada em algum lugar no futuro. Eu estou dizendo que a entrega não é uma ação, não é uma ferramenta, não é uma técnica, enfim, não é um meio a ser empregado; ela é uma finalidade em si mesma. Não é que a entrega o conduza à liberdade, entrega é liberdade! Elas são sinônimos, significam exatamente a mesma coisa. Você está olhando para a mesma coisa de dois ângulos diferentes.

“... por isso penso que minha entrega não se trata uma entrega verdadeira.”

Sua entrega não é real nem irreal. Não se trata nem mesmo de entrega, absolutamente. Nem sequer é irreal.

“Eu consigo testemunhar isso, mas o problema é que é justamente este ‘eu’ que está testemunhando. Portanto, tudo o que decorre a partir desse “eu” que testemunha só pode ser um reforço para o ego. Eu me sinto enganada pelo meu ego.”

Quem é este “eu” que você diz estar se sentindo enganado pelo ego? É o próprio ego. O ego é tal que ele pode dividir a si próprio em vários fragmentos, em várias partes, e então começa o jogo. Você é ao mesmo tempo o caçador e a caça. Exatamente como um cachorro tentando agarrar a própria cauda, saltando de um lado para o outro e contorcendo-se. E você olha e vê a absurdidade disso – mas você vê o absurdo, o cão não pode vê-lo. Quanto mais ele acha difícil agarrar a cauda, mais louco ele fica, e mais ele salta. E quanto mais rápido e alto o cão salta, mais alto e mais e rápido é o salto da cauda. E o cão não consegue conceber o que está acontecendo: ele, um grande e exímio apanhador, não consegue agarrar uma simples cauda?

Isso é exatamente que está acontecendo com você. É o “eu” que se empenha em apanhar, e que o tempo todo é o caçador e a presa. Perceba como isso é ridículo e, mediante essa própria percepção, livre-se de tudo isso.

Não há nada a ser feito, absolutamente – nem mesmo uma única coisa. Eu digo: vocês já são aquilo que você desejam se tornar. Vocês são Budas, jamais vocês foram outra coisa. Basta que percebam.

E quando você diz “eu consigo testemunhar”, de novo isso é o próprio ego. Sempre que você empreender a ação de testemunhar, o “eu” será criado novamente, porque o ato de testemunhar também é um fazer, há um esforço envolvido. Relaxe. No relaxamento – quando não há nada a ser observado e ninguém para observar, ou seja, quando você não mais estiver integrado às divisões da dualidade – então surge uma diferente qualidade/espécie de testemunhar. Haverá o testemunhar, mas não haverá a ação de testemunhar. O “eu” não terá qualquer ação para praticar. E o “eu” somente pode sobreviver se houver uma ação ao qual possa se agarrar, porque é da ação que ele retira o seu senso de “eu sou”. Assim, diante desse tipo de testemunhar o ego é impotente. Lembre-se: o testemunhar existe e ocorre por si mesmo, tendo uma característica suave e passiva. Ele não é agressivo. Se houver ação, o testemunhar se torna agressivo: o esforço passa a ser necessário, você tem de estar tenso. Esteja à vontade, descontraído, relaxado. Fique no momento presente. Simplesmente esteja aí, permitindo que tudo seja e ocorra por si mesmo. Nessa consciência em que você está apenas aí sentado sem fazer nada, a primavera chega e a grama cresce por si só.

Esta é a síntese de toda a abordagem budista: O que quer que você faça apenas criará e reforçará ainda mais o fazedor (ego) – incluindo testemunhar, pensar, entregar-se. Qualquer coisa que você fizer vai criar a armadilha. Nada é necessário a ser feito de sua parte. Apenas ser... e deixar as coisas acontecerem. Não tente controlar, não tente manipular. Deixe que a brisa passe por você, permita que os raios solares cheguem, permita a vida dançar, e quando chegar o momento deixe que a morte venha e dance a sua dança em você também.

Para mim esse é o significado de sannyas: não é algo que você faz, e sim quando você abandonou todo o fazer porque percebeu a absurdidade disso tudo. Quem você pensa que é para fazer alguma coisa? Você é somente uma onda nesse imenso oceano. Num dia você é, noutro dia você desaparecerá; o oceano continuará. Por que você deveria ficar tão preocupado? Você surge e desaparece. Enquanto isso, durante esse pequeno intervalo, você se torna tão preocupado e tenso, que você toma sobre si todos os fardos, e carrega pedras em seu coração – e por razão nenhuma.

Vocês são livres neste exato momento!

Eu os declaro iluminados neste exato momento. Mas vocês não confiam em mim. Vocês dizem: “Está bem, Osho, mas apenas diga-nos como nos tornamos iluminados.”

Esse impulso de querer se tornar, de querer alcançar e de desejar, segue saltando sobre cada objeto com que você se depara. Às vezes ocorre com o dinheiro, às vezes com Deus. Às vezes com o poder, às vezes com a meditação – o objeto pode ser qualquer um, e você logo o agarra. Mas não se apegue, não possua; o desprendimento é o caminho para viver a vida real, a vida verdadeira.

Deixe as coisas acontecerem, deixe a vida ser um acontecimento, e haverá apenas alegria, regozijo, júbilo – de modo que jamais poderá haver uma frustração, porque você nunca esperou por nada em primeiro lugar. O que quer que venha é bom, é bem-vindo. Não há o fracasso, nem o sucesso. O jogo do sucesso e do fracasso foi descartado. O sol aparece pela manhã e o acorda, e a lua surge à noite cantando uma canção de ninar e você vai dormir. A fome vem e você come, e assim por diante. Isso é o que os mestres Zen querem dizer quando declaram: “Se estiver com fome, coma; quando estiver com sono, vá dormir. Não existe outro caminho.”

E eu não estou lhe ensinando a ser inativo. Eu não estou dizendo para não ir trabalhar. Não estou dizendo para deixar ganhar o seu pão, nem estou dizendo para renunciar ao mundo e depender dos outros – não, de modo algum. Mas não seja um fazedor. Sim, você tem de comer quando está com fome, e para comer você tem de ganhar o seu pão – mas torne-se alerta de que não existe ninguém fazendo isso. É a fome em si que está agindo, mas não há ninguém fazendo isso. É a sede em si que o leva a procurar por um poço ou por um rio. É a própria sede agindo; não existe ninguém para estar com sede. Descarte de sua vida os nomes e pronomes e deixe que apenas os verbos existam.

Buda diz: A verdade é igual a quando você vê um dançarino: o dançarino não existe, apenas a dança. Quando você se depara com um rio, em verdade não há o rio, mas apenas o fluir do rio. Existe o verbo e não o nome. Quando você vê uma árvore, não há a árvore, existe apenas o processo contínuo e constante de “ser” da árvore. Quando você olha para um sorriso, não há ninguém sorrindo, há apenas o sorriso: o verbo do sorrir está acontecendo. A vida é um processo.

Mas nós fomos acostumados a pensar sempre em termos de substantivos: nomes consumados, estáticos. Isso cria problema. Na vida nada está concluído ou estagnado – tudo é um fluxo, um fluir. Aprenda a viver com isso, flua com isso, flua com este rio, e nunca seja um fazedor. Mesmo quando você estiver fazendo, não seja um fazedor. Apenas o fazer existe, mas não há o agente. Quando esse insight se estabelecer profundamente em você, então não haverá nada mais.

A iluminação não é algo como um objetivo a ser alcançado. Ela é esta própria vida simples e comum que o rodeia. Mas quando você não está se esforçando ou lutando ocorre um milagre: esta vida comum torna-se extraordinariamente bela. Então as árvores são mais verdes, então os pássaros cantam em tons mais ricos, e tudo o que está acontecendo ao redor é precioso. Pedras comuns são diamantes.

Aceite esta vida tão simples e comum. Basta descartar o fazedor, o “eu”. E quando eu digo para descartar o fazedor, não se torne nesse ato um fazedor! Basta olhar para ele e compreendendo a sua irrealidade. E ele desaparece.

Osho

As Limitações da Linguagem

Eu queria esclarecer sobre as limitações da linguagem. Porque isso pode ser uma grande armadilha.

Linguagem é algo muito poderoso que nós, seres humanos, possuímos! Belíssimo poder, maravilhoso poder, pura linguagem. Quando começamos a falar, o fundamental ainda permanece distante, porque a compreensão depende daquele que escuta.

Quando falamos em realização, iluminação, temos a impressão de que seja algo muito difícil. Nós compreendemos desta maneira simplesmente pela maneira que compreendemos a linguagem, que sempre nos coloca alguma coisa em separado de outra.

Isso é a base das divisões entre nós: a linguagem, a mente que sempre aponta diferenças, distâncias, separações.

Essa separação externa repercute na compreensão de uma separação interna. Mas, na verdade, estamos todos juntos, sempre, isso é apenas os artifícios da linguagem.

Eu nem lhes digo: façam alguma coisa ou não façam alguma coisa. Nem um, nem outro é certo ou errado. Não existe algo versus algo! Paz não é algo versus algo. Paz é inclusiva. Mesmo a palavra inclusiva é pequena para defini-la.

Perguntaram-me: o que são os ensinamentos não-duais? O que posso dizer é que não dualidade é TOTALIDADE, está incluída toda a dualidade! Não está se criando oposição entre dualidade e não- dualidade. É assim que nossa mente funciona, criando rivalidades, escolhendo alguma coisa em detrimento de outra, uma coisa melhor que a outra, uma mais alta que a outra.

Quando nós deixamos isso para trás, apenas pela pura investigação, simplesmente por estarmos acostumados a usá-los, nós deixamos esses termos para trás. Apesar deles não estarem errados, podemos ir além deles, numa visão mais ampla, inclusiva, livre dessas terminologias. Embora nós conversemos, podemos relativizar esses termos, podemos ir além dessas diferenças. Sair desses conceitos de que dualidade é isso, não-dualidade é aquilo, apenas esqueçamos disso por um momento, isso ainda é uma batalha da mente.

A mente aberta não se fixa. Toda essa busca do que devo fazer, aonde devo chegar, aquilo que quero alcançar, deve ser esquecido, abandonado.

Aquilo que é, basta. Não existe nada a alcançar, nem erros nem acertos, precisamos encontrar aquilo que É. Neste momento veremos que não excluímos nada, nem colocamos peso em nada, é apenas uma experimentação.

É maravilhoso saber "coisas", maravilhoso saber de muitas coisas. É parte, como disse, da natureza humana. Mas, aquilo que investigamos aqui é aquilo que está livre de saber as "coisas", aquilo que é intocável por qualquer conhecimento, aquilo que é independente daquilo que chamamos "conhecimento", não separado deste, mas independente, livre.

Não importa o que sabemos ou não sabemos. Isto, permanece em paz. Quando dizemos que conhecemos nossas limitações, de variadas maneiras, estamos caindo novamente na fixação das limitações superficiais e nos afastando daquilo que está além disso e que permanece ilimitado.

Um dos meus mestres dizia: "pare de adiar. Você já é realizada, iluminada!" A mente é especialista em criar adiamentos. Preciso lidar com minha raiva, preciso lidar com minha insegurança, ainda preciso parar de me odiar. Pare com isso! Simplesmente pare de se odiar! Veja as histórias de auto-ódio, veja quanto você se alimenta dessas histórias antigas e sinta que se você parar de contar essas histórias para você mesmo imediatamente, você está livre, solto e o ódio se transforma instantaneamente em amor, em paz, porque sempre foram seus próprios pensamentos que criaram a guerra dentro de você. Todos esses dramas de auto-ódio ou de não se odiar mais, tudo isso ainda é uma peça teatral que você insiste em contar para si mesmo. Feche essas cortinas dramáticas e isso é paz.

Existem muitas memórias, muitas histórias humanas que são horríveis e nós sabemos disso. Claro que sabemos. Rivalidades acontecem sempre, ontem, hoje e muito provavelmente no futuro também. Não sugiro que você negligencie isso, sugiro que você esteja bem consciente sobre isso. Não se trata de um processo de negação. Existem essas mesmas rivalidades dentro de cada um de nós.

Na experiência direta, existe uma revelação que nem possui um nome, já que é tão próxima para se ter um nome. É o que se chama de Verdade, ou Liberdade, ou Paz, que está além da compreensão. Paz é mais próxima do que a compreensão, não é fora do alcance, é a mente que tem o poder de se afastar disso.

Neste momento, simplesmente sente-se e reconheça que tudo está aí, acontecendo. Não existe nada errado! Nós temos a oportunidade de parar com essa discussão interna, seja ela sobre nós, o outro ou sobre outra coisa qualquer, passado, futuro.

Discussões mentais são sobre alguma coisa passada ou futura! Vejam que essas discussões não estão erradas também, são capacidades humanas para planejar, idealizar, fazer análises de probabilidades. Do mesmo modo, aprender com o passado, aprender com seus enganos, mas isso não nos impede de cometermos os mesmos enganos, porque ainda existe alguma coisa que precisa ser realizado, nem mesmo é uma coisa ou nenhuma coisa, é indefinível, não é algo é você.

Você é indefinível!!


Se estiver disposto a se render por um momento, deixar de lado toda e qualquer definição sobre si mesmo - boa ou ruim - apenas renda-se, abandone todas as definições subjetivas, de que algo necessita ser mudado, apenas se renda, abandone todas as definições. você descobre diretamente as mentiras por trás dessas "necessidades".

Você é sempre indefinível.
O Um é indefinível.
Quem somos nós, é indefinível. E isto não está em oposição à definição. É anterior a qualquer definição, dentro disto. Quem você é, é sempre aqui."

GANGAJI

quinta-feira, 21 de março de 2013

Perca-se!

É muito comum que, ao optarem por uma busca espiritual, as pessoas sintam-se ligeiramente superiores às chamadas pessoas "mundanas", assim entendidas aquelas que projetam nas coisas do mundo o seu senso de identidade, as suas expectativas de realização e satisfação.

Mas, essa "ligeira superioridade" é puramente ilusória! Ela também é mundana e, pode-se dizer: uma grande armadilha! Na realidade, o indivíduo que se sente melhor do que os outros porque passou a estar voltado para as nobres coisas de "dentro"- em detrimento das inferiores coisas "de fora" - não está fazendo nada mais do que nutrir o mesmo falso senso de identidade. É a mesma entidade egóica que, naquele instante, está apenas envaidecida pela idéia de estar evoluindo, de estar acima dos demais ou, em outras palavras, de ter encontrado uma versão melhor de si mesma! Como diz Eckhart Tolle, na verdade, é o mesmo ego reencontrando-se a si mesmo pela porta do fundos. É a mente, mais uma vez, enredando a si mesma!

Só está em situação de clareza (e isso jamais significará superioridade) aquele que percebe que a realização de sua verdadeira natureza está muito mais relacionada a perder do que a ganhar. A anular-se, ao invés de evoluir. Muito mais relacionada a desaparecer como indivíduo do que a sentir-se um indivíduo melhor, maior ou engrandecido pela prática espiritual.

A iluminação espiritual - e isso foge completamente da capacidade de compreensão e aceitação do ego - é um esvaziar-se, um perder-se, um anular-se...   ...um morrer, enquanto entidade psicologicamente autônoma e separada. Enquanto uma historieta pessoal.

Era a essa necessidade de auto-anulação (que leva à percepção da realidade) que se referia São Francisco de Assis, ao dizer "...é morrendo que se vive para a vida eterna!".

Era a esse desaparecimento pessoal que se referia o Cristo Jesus, ao dizer "...negue-se a si mesmo e siga-me!".

É a isso que se refere o ZEN com a clássica proposição: "morra, antes que você morra"!

Finalmente, por ter compreendido isso é que Jidu Krishnamurti dizia: "você não pode viver sem morrer. Você não pode viver se você não morrer psicologicamente a cada minuto. Este não é um paradoxo intelectual. Para viver completamente, integralmente, todos os dias como se fosse uma nova beleza, deve estar morrendo de tudo de ontem, caso contrário, você vive mecanicamente, e uma mente mecânica nunca pode saber o que é amor ou o que é a liberdade."

Como diziam os místicos cristãos da idade média, somente quando o falso e pequeno eu, a entidade psicológica e autônoma (que ambiciona, teme, deseja e luta) sai de cena, há espaço para que o verdadeiro eu, o EU REAL manifeste-se como É.

Portanto, é preciso estar atento às emboscadas criadas pela mente que, na sua constante e desesperada necessidade de auto-referenciação, de auto-reconhecimento e de auto-sustentação, sempre pula de um personagem para outro, fazendo trocas. 

Você nunca é nenhum personagem, seja ele ateu, místico, cristão, espírita ou budista. E, por isso mesmo, a prática mecânica da caridade, a incursão frequente a templos budistas e a utilização de roupas e nomes indianos, tudo isso, ainda é apenas o ego, travestindo-se de figurinos que lhe parecem mais elevados.

Você é aquilo que sobra e resplandece quando o último resquício, o último traço do último destes personagens tiver morrido. E, depois disso, depois dessa morte voluntária, haverá VIDA, no seu mais amplo e inimaginável sentido!

quarta-feira, 20 de março de 2013

A Yoga da Auto-Averiguação

"Cada ser vivente aspira ser feliz, intocado pelo desgosto. E cada qual tem o maior amor por si mesmo, o que se dá unicamente pelo fato de que a 'felicidade' é sua verdadeira natureza. Assim, de modo a realizar aquela felicidade inerente e imaculada, experienciada em sono profundo quando a mente é deixada para trás, é essencial conhecer a si mesmo. E, para obter tal conhecimento, a indagação 'Quem sou eu?', feita em busca do Ser, é o meio por excelência.

"Quem sou eu?" Não sou este corpo físico, nem os cinco órgãos de percepção; não sou os cinco órgãos de atividade externa, nem tampouco as cinco forças vitais e nem mesmo a mente pensante! Também não sou aquele estado de inconsciência que apenas retém as tendências sutis da mente, sendo portanto livre da atividade funcional dos órgãos dos sentidos e da mente...(...)

Deste modo, rejeitando sumariamente todos os acima mencionados acessórios do corpo físico, com suas funções, afirmando 'eu não sou isto' e também 'eu não sou aquilo', o que permanecer em separado e isolado naturalmente, este puro 'estado de percepção', é isto que eu sou! Este estado de puro conhecimento é, por sua própria natureza, SAT-CHIT-ANANDA, ou seja, pura existência-pura consciência-puro júbilo...

Se a mente, que é o instrumento de conhecimento e base de toda atividade, cessa, a percepção do mundo como realidade objetiva também cessa. A menos que a percepção ilusória da 'cobra na corda enrolada'  cesse, a corda sobre a qual a ilusão se forma, não é reconhecida como tal.

De modo semelhante, a menos que a ilusória percepção do mundo como sendo real desapareça, a Visão da verdadeira natureza do 'EU', sobre o qual a ilusão surgiu, não é alcançada!"

Fonte: www.mergulhe-fundo.blogspot.com
Copyright a Sri Ramanashraman, Tiruvannamalai-Índia.

domingo, 17 de março de 2013

Quem é Você?

"Você tem que tornar-se um ninguém!
No momento em que você é ninguém, um silêncio descende em você, seguido de um contentamento.
Não é um contentamento com o mundo, é um contentamento com a existência, com as estrelas, com as rosas, com o oceano, com as rochas, com as montanhas.
Não é um contentamento em ser o presidente de um país ou um primeiro-ministro; não é um contentamento em ser o homem mais rico do mundo. Não tem nada a ver com o seu assim chamado mundo de ambições.
É um estado absolutamente não-ambicioso. você está totalmente vazio, vazio até de si mesmo. Somente nesse vazio, o contentamento floresce, desabrocha - e esse contentamento é divino."
OSHO

"Desnude-se da mentira e encontre o lugar de onde o “eu” vem.
Sem projetar o 'eu', você é Shiva.
Sua energia é a projeção na qual você brinca, e Consciência é a fonte dessa brincadeira – fonte da mente, inclusive.
E isso é tudo."
PAPAJI