quinta-feira, 21 de março de 2013

Perca-se!

É muito comum que, ao optarem por uma busca espiritual, as pessoas sintam-se ligeiramente superiores às chamadas pessoas "mundanas", assim entendidas aquelas que projetam nas coisas do mundo o seu senso de identidade, as suas expectativas de realização e satisfação.

Mas, essa "ligeira superioridade" é puramente ilusória! Ela também é mundana e, pode-se dizer: uma grande armadilha! Na realidade, o indivíduo que se sente melhor do que os outros porque passou a estar voltado para as nobres coisas de "dentro"- em detrimento das inferiores coisas "de fora" - não está fazendo nada mais do que nutrir o mesmo falso senso de identidade. É a mesma entidade egóica que, naquele instante, está apenas envaidecida pela idéia de estar evoluindo, de estar acima dos demais ou, em outras palavras, de ter encontrado uma versão melhor de si mesma! Como diz Eckhart Tolle, na verdade, é o mesmo ego reencontrando-se a si mesmo pela porta do fundos. É a mente, mais uma vez, enredando a si mesma!

Só está em situação de clareza (e isso jamais significará superioridade) aquele que percebe que a realização de sua verdadeira natureza está muito mais relacionada a perder do que a ganhar. A anular-se, ao invés de evoluir. Muito mais relacionada a desaparecer como indivíduo do que a sentir-se um indivíduo melhor, maior ou engrandecido pela prática espiritual.

A iluminação espiritual - e isso foge completamente da capacidade de compreensão e aceitação do ego - é um esvaziar-se, um perder-se, um anular-se...   ...um morrer, enquanto entidade psicologicamente autônoma e separada. Enquanto uma historieta pessoal.

Era a essa necessidade de auto-anulação (que leva à percepção da realidade) que se referia São Francisco de Assis, ao dizer "...é morrendo que se vive para a vida eterna!".

Era a esse desaparecimento pessoal que se referia o Cristo Jesus, ao dizer "...negue-se a si mesmo e siga-me!".

É a isso que se refere o ZEN com a clássica proposição: "morra, antes que você morra"!

Finalmente, por ter compreendido isso é que Jidu Krishnamurti dizia: "você não pode viver sem morrer. Você não pode viver se você não morrer psicologicamente a cada minuto. Este não é um paradoxo intelectual. Para viver completamente, integralmente, todos os dias como se fosse uma nova beleza, deve estar morrendo de tudo de ontem, caso contrário, você vive mecanicamente, e uma mente mecânica nunca pode saber o que é amor ou o que é a liberdade."

Como diziam os místicos cristãos da idade média, somente quando o falso e pequeno eu, a entidade psicológica e autônoma (que ambiciona, teme, deseja e luta) sai de cena, há espaço para que o verdadeiro eu, o EU REAL manifeste-se como É.

Portanto, é preciso estar atento às emboscadas criadas pela mente que, na sua constante e desesperada necessidade de auto-referenciação, de auto-reconhecimento e de auto-sustentação, sempre pula de um personagem para outro, fazendo trocas. 

Você nunca é nenhum personagem, seja ele ateu, místico, cristão, espírita ou budista. E, por isso mesmo, a prática mecânica da caridade, a incursão frequente a templos budistas e a utilização de roupas e nomes indianos, tudo isso, ainda é apenas o ego, travestindo-se de figurinos que lhe parecem mais elevados.

Você é aquilo que sobra e resplandece quando o último resquício, o último traço do último destes personagens tiver morrido. E, depois disso, depois dessa morte voluntária, haverá VIDA, no seu mais amplo e inimaginável sentido!

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